terça-feira, dezembro 20, 2011


Visita ao Douro…

Nesta intermezzo da vida ,onde para uns, despudoradamente vou alinhando uma palavras, é certo ,por vezes, sentir-me, com receio de que os outros pensem que tenho opinião.

Não é exactamente isso que pretendo. Tão só desafiar os outros a ter opinião.

Nada é melhor ( ou foi!) na vida do que desafiar uma mulher a sê-lo. E de repente Ela é-o.

Temos de estar preparados para passar de desafiadores a desafiados.
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Gosto das palavras pesadas. Mas não me inebrio com elas. Nisto de beber quase sempre soube parar.

Palavras pesadas, só para (tentar) descrever o mar. Palavra : perante o mar sempre compreendi a minha pequenez.

Lembro-me do Cabo João. Passava horas enrolado no beliche, semi – embriagado, semi -inerte, alheado do que lhe ia em volta.. Mas quando o mar vinha e todos enjoavam ,chamava-se o Cabo João. Brincava com o raio da roda do leme. Numa noite cerrada, tudo enjoado na ponte(eu também),comandante há muito estendido(é mau ver-se um Comandante enjoado !,.) o Cabo olhou-me e disse:

Está à rasca – Sr. Imediato. Mete medo heim?! Não tenha medo: eu ando sempre nas ondas ; sempre á procura delas. Sem espinhos não há rosas…

OH cabo : deste-me uma lição para a vida inteira. Por isso Te fiz continência quando me vi embora.

Agora olho para estes gálicos enjoados da vida, e lembro-me de Ti. Eu não procuro a vida. Como tu no beliche, espero que a sacana me venha desafiar. E chegada….aqui me tem …a magana

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Vim lá das escarpas de Tabuaço.

O Douro desafia-me. Este ano vou trepá-lo. Eu e o «Costa-Nova».Não vale a pena ficar, aqui ,tolhido, à espera que a putéfia venha, disfarçada – atraente, num dos seus muitos disfarces – e me enloile.

Aquela grandeza submete-me. Aqui ,perto do mar, na nossa imensidão plana, sinto a minha «escala»! Entendo-a a 2D.Lá, no fundo do vale, a «escala »parece-me acto de cega brutalidade interior. Não dou por mim. Percebo a estranha sensação de « me ver a três dimensões»,sem me descobrir naquela «cagadela» de pulga.

SF(Dez 2011)





quinta-feira, novembro 24, 2011

Pedaços da História da AHBVI


Em 1932,numa altura em que se gerou um grande movimento em torno da AHBVI, visando instalá-la na sua sede definitiva, na Rua Manuel da Maia, a Direcção da Instituição afadigava-se em reunir ajudas materiais para fazer face ao investimento com tal obra. Independentemente de contar com grandioso apoio da Câmara de Dinis Gomes.


                                                      Corpo Activo com Com. Sacramento

A AHBVI ,fundada em por iniciativa de meia dúzia de ilhavenses, de onde se destacavam o Dr Francisco Moura,seu primeiro Presidente, António Encarnação Júnior (seu 1º Comandante), Henrique Cardoso Figueira, Anselmo Corujo e Joaquim António Bio, albergou-se em diversos locais ao longo dos seus primeiros anos de existência. Primeiro num edifício perto do Largo do Oitão, propriedade do Ten. Mendonça. Logo depois ocupando parte do r/c do prédio da esquina da Praça Mouzinho da Silveira, propriedade do Cap.Bagão,e onde mais tarde esteve instalada a loja da D.Lidinha. Daqui passou para a Capela, para o r/c do prédio da Srª Cartaxo, de onde saiu para se instalar num edifício integrado no Mercado Municipal (1914), do lado nascente. Durante este período a bomba manual (hoje em exposição no Quartel, verdadeira peça de Museu) foi albergada em local apropriado, na actual Rua St António , numa garagem onde mais tarde esteve a oficina do «Artistinha».

Em 1936 o quartel e a sede foram, então, instalados na referida Rua Manuel da Maia,em prédio construído de raiz para o efeito, mesmo ao lado da primeira cabina de distribuição da energia eléctrica ,erecta em 1926.

Para reunir fundos, organizaram-se, na altura, diversos acontecimentos.

È destes que recordamos, numa foto de 1932, os elementos da Velha Guarda do Sport- Ílhavo ,que na Vista Alegre defrontaram a equipa dos jovens de honra da referida Associação. Numeroso publico, presenciou a renhida disputa .A Velha Guarda(onde figuravam as velhas glórias do futebol Ilhavense – in Beira Mar de 17 Janeiro 1932) entrou equipada de chapéu de coco e papillon, luvas e calção azul, o que fez delirar a assistência, especialmente a numerosa claque feminina.



1ºPlano:M.Mendes,Evangelista Ramalheira, M. Oliveira, Carlos Marcela, Bento Capote, João Sousa (cap) e J.Ramalheira (ZUCA);2ºPlano Manuel Balseiro, Manuel Fonseca, E.Vieira, Frente Leopoldo Sacramento

Resultado final (sem favores do arbitro que se tinha retirado, acreditando no fair-play dos jogadores em campo),foi de 3-2, favorável à Velha Guarda.

SF

quarta-feira, outubro 26, 2011








RIA ADORMECIDA



Tarde limpa, intemporal

Que o acaso pintou

De uma tranquilidade imaculada

A ria parece estender-se até ao infinito.

Sobre ela, docemente pousadas

As embarcações miram-se no vitral espelhado

Num momento exacto a sugerir eternidade;

Há nesse olhar a mudez da saudade

De um tempo não esquecido

Ou então apenas, um murmúrio traído (?!)

Aqui o tempo findou

Anunciando a noite mais bela

Onde amor se escreve tão longo


Como curta a vida.




No marulhar dos murmúrios.

A luz parece despida, recolhida,

Alheada a entretecer os dias da memória.

Deixo-me aqui ficar, esquecido, a sorve a maresia

A sonhar acordado

Com a estranha precisão daquela simetria.

Fico à espera que as sereias venham de madrugada

Para me levar para qualquer lado.

Singrando no seu peito nú

Chegarei a um porto de abrigo,

Onde a noite não escureça

A encontrar a natureza redoirada.

Para a pintar no silêncio recolhido.

                           [ de meus olhos amanhecidos.

SF (Out 2011)

terça-feira, outubro 25, 2011

O MERCADO do TORREÃO

Logo após a implantação da Republica, em 1911, a Câmara de Ílhavo presidida por Abel Regalla, evocando estado de ruína da Capela das Almas e afirmando existir perigosidade para os frequentadores do oratório de culto,ao tempo em que exibia um parecer de conforto do Departamento das Obras Publicas, de Aveiro(a subscrever a intenção), decide desmantelar a dita Capela, mandada erigir pelo Prior João dos Santos, em 1771.





                                                    A Capela das Almas





                                                 A Capela das Almas vista do Alto –Bandeira

Em 1914, a Câmara, da presidência de Joaquim Valente decide edificar no mesmo local um Mercado Municipal, com o que pretendeu substituir a Praça Alexandre da Conceição (actual Praça da Republica), onde até então, depois de abandonado o Largo do Oitão, se fazia o mercadejar diário, na Vila.


                                              Praça  Alexandre da Conceição com as vendedeiras ao fundo


O Mercado de 1914 era muito simples. No topo sul um telheiro abrigava do tempo as vendedeiras da hortaliça.No interior do mesmo, deveria terem existido (percebe-se de uma fotografia) uns outros telheiros. Funcionava, aí também, o açougue municipal. O canto sul – nascente era fechado por uma pequena torre (encimada por uma imitação de ameias), no local onde anteriormente tinha estado a Capela das Almas.Nessa guarita estavam instalados os serviços, de pagamento e fiscalização, das taxas de terrado.



                                                            O Mercado de 1914
Foi só em 1925, que a Câmara de Diniz Gomes decide a construção de um novo Mercado. Tratou-se – então sim! – de um edifício de uma certa monumentalidade, de traça muito bonita ,muito funcional para a época ,de linhas muito harmoniosas ,com vistosos pórticos de acesso ao seu interior ,a sul e nascente , realçados ao centro por uma construção inspirada nos torreões dos grandes mercados, do Porto e Lisboa. Localizava-se na esquina sul-nascente, voltada para estrada nacional, encimada por com uma cúpula em abóbada ,revestida a chapa metálica, pintada.


                                                                      O Torreão


Nos alçados,sul e nascente,alinhavam-se várias lojas, com possibilidade de acesso, pelo interior,ao mercado.





                                                            Fachada Sul com Lojas

O mercado era muito espaçoso no seu interior. Circulava-se com grande à vontade, acedendo-se, quer aos quatro telheiros centrais onde as vendedoras e regateiras expunham os seus produtos, quer às tendas de vendas, sitas nos seus laterais. Do lado sul vendia-se o pão de Vale de Ílhavo; do lado norte, ficava o posto da guarda fiscal. A seu lado, para poente, distribuíam-se as bancas de peixe, fresco e salgado. Do lado nascente do posto, ficavam as vendas de passamanarias

No pórtico de acesso do lado sul, na zona coberta, na entrada, situavam-se, á direita e à esquerda, os guichets do Manuel das «Senhas», e do « Manel Pitato», o fiscal camarário.

Ainda no alçado sul ,postavam-se várias lojas : a poente do Torreão ficava :o talho Madail e um pequeno espaçam para o recoveiro . Depois do portão dispunham-se as lojas da srª Ançã, a mercearia e vinhos, do Octávio (anteriormente do sr. Graça),o latoeiro Verdade e o talho do Morgado.

No lado poente, voltado para a estrada nacional,situava-se o 1º posto da PSP (do Jacques & do Jonhs, assim eram conhecidos aqueles simpáticos e bonacheirões zeladores da ordem pública),e o talho do Bela. Depois do portão, para norte, ficava a loja de vidros de louças do Quintino, a loja de panos da Esmerada, e a provisória sede da A.H.B.V.I.



No canto norte, situava-se a taberna do João da«Fonte»,cuja alcunha era provinda da fonte que existia naquele canto, que tinha vindo substituir a primitiva fonte, situada no cruzamento da Rua da Lagoa –Alqueidão, com a estrada nacional.

O Mercado era o ponto de encontro do mulherio. Local para diariamente comprar o necessário, mas também para botar faladura a saber da «nobedades»da véspera, em momento e sítio apropriado para queixume da desgraçada da vida que se dizia estar pelas horas da morte. Ali se faziam e desfaziam nós da vida quotidiana das gentes, se combinavam e garantiam trautos, se faziam arranjos, ou se acudia a precisões.Ou mais prosaica e comumente, se destravava a língua a chaquear, a codilhar da vida de uns e de outros, na mor das vezes na codrice do que não se conhecia mas se ouvia dizer que…

A construção do mercado foi antecedida por intensa polémica. De facto, foi na altura do início da obra (1925) muito discutido se o alinhamento da construção deveria recuar,de modo a permitir um alargamento do local, suavizando a curva que antecedia a subida para o Alto-Bandeira.

                                                                   A Razão da polémica

Curioso foi que em «O Ilhavense», José Pereira Teles, ter discordado, pela primeira vez, de Diniz Gomes ,um atrevimento muito notado, mas que não teve maiores consequências,já que seria o mesmo Pereira Teles quem promoveria o célebre jantar de desagravo e apoio a Diniz Gomes ,quando a câmara




                                            Jantar de desagravo a Diniz Gomes (1925)


 deste, sujeita a inspecção, foi, em seguimento da mesma, dissolvida (dec. Lei 11875 de 13 de Julho de 1925).Substituída pela Comissão Administrativa, constituída pelos Drs José Santos e Júlio Calixto, e ainda, Venceslau de Oliveira. Em 27 de Julho de 1926 foi eleito Júlio Calixto para presidir á Comissão Administrativa da Câmara Municipal.

Diniz Gomes não aceitaria alvitres nem conselhos, e implantaria o Mercado onde tinha planeado.

A vessada do rio tinha já sido comprada à D. Henriqueta Maia.E Diniz Gomes teria já decidido aí implantar o Jardim com o monumento aos Mortos da Grande Guerra (cujo plano fora apresentado em sessão de 12.11.1924), teimando por isso em manter o alinhamento mais avançado sobre a estrada nacional. E teria ainda deliberado adquirir, por 18.500$00, o edifício do Convento (03.03.1924), onde pensava, e veio a instalar, os Paços do Concelho, que por aí se quedaram até que no final do séc. XX, quando foi construído o  edifício da Câmara(onde se instalou o tribunal).

Senos da Fonseca







quinta-feira, outubro 20, 2011


E assim fui sendo despertado para a beleza da História


(que detestava quando impingida pelo compêndio «mattosiano«)




Era frequente o meu Pai levar-me a Lavos, ali junto á Figueira da Foz, cidade onde leccionou, a uma bonita mansão que ficava à beira da estrada nacional que ligava Figueira, a Leiria.E junto a uma frondosa árvore (palmeira ,creio) contar-me ( vezes repetidas mas sempre cheias de interesse, pois de cada vez juntava mais um ou outro facto interpretativo) que ali, sob a copa daquela frondosa e secular árvore, se teria acolhido Arthur Wellesley (futuro Duque de Wellington) , quando em Agosto 



Arthur Wellesley

 de 1808 desembarcara na referida povoação, para vir combater os Franceses. O que faria na Roliça, e depois em Vimioso, levando à capitulação de Junot. Um fogoso ex-sargento de 28 anos,elevado a general, chegado a Lisboa disposto a receber a capitulação do Regente.Só que este já partira na véspera para os brasis. Junot instalado em Lisboa vai-se  adoçando com as carícias lascivas da mulher do Conde de Ega, que lhe concedia os favores em troca da nomeação do «cornigero» marido para encarregado dos Negócios da Justiça.


Junot

Aproveitava, meu Pai, para me dar conta, e assim me responder, ao que teria estado por detrás das invasões Napoleónicas(coisa que nas aulas ninguém me teria explicado com lógica).E  tentava retirar-me o  o mau julgamento que (eu) fazia da debandada «cobarde» do feioso D. João VI para o Brasil, com a sua abominável Joaquina.

E claro: dava-me uma extensa ideia do que se seguiu e como,mais tarde, se teria desenrolado a campanha na nossa região,aquando da 2ª invasão. Pormenor de que eu nunca teria ouvido falar nas intragáveis aulas oficiais.

Assim contava-me o episódio do roubo perpetrado pelo franceses na Igreja de Ílhavo, e por acréscimo, de como o Padre Malaquias tinha enterrado a custódia (e outras – poucas!- riquezas do culto) salvando-a do vandalismo dos homens de Junot. Dava-me conta da importância dos elementos dos servidores da Igreja participando activamente na guerrilha que dizimou uma boa parte dos exércitos napoleónicos,uma cáfila perigosa de maçons e jacobinos, prontos para difundir  ideias perigosas para a Instituição . Lutou-se assim, tumultuosamente e com raiva, pelo «trono e pelo altar», defendendo o Regente e a «santa igreja». Incentivando as populações a cumprir a estratégia de «terra queimada», maquinada por Wellington.

A história, assim, era um deleite. História de factos, mas em que cada facto tinha a sua história e o seu lugar. Um exercício absorvente onde o factor humano vinha sempre como sujeito da história.

Andando agora às voltas com Sousa Ribeiro e a Barra de Aveiro(antes e depois),passou-me pelas mãos muita documentação sobre a importância da referida Barra na 2ª Invasão, quando, logo após a sua abertura no local definitivo (1808),mais concretamente em 13 de Maio de 1809,aqui deu entrada uma notável frota de navios (40 para uns,41 para outros).Navios que vieram trazer provisões aos exércitos de Paget e Trant, que intentavam a libertação do Porto.

Acho curioso aqui dar conta dos principais registos que fui apontando.

Em 2 de Junho de 1809,Luis Gomes de Carvalho, o engenheiro que dirigiu os trabalhos de abertura da barra no local onde hoje se encontra, dava conta a D. Miguel Pereira Forjaz, Ministro da Guerra que ” no dia 13 de Maio ,por feliz coincidência dia do aniversário de S.A, entraram na Barra de Aveiro,39 navios de transporte ingleses, e mais dois brigues de guerra, num total de 41 navios”.

De facto Wellington aproveitaria o bom estado da Barra para mandar abastecer o «seu» exército que se preparava para atacar os franceses que tinham atravessado o Vouga, levando-os de debandada até ao Porto.

O Juiz da Alfândega de Aveiro, José António Leão, chega a informar  que a frota escoltada pelo brigue Port Mahon, entrou com viveres e forragens para o exército inglês e dada a boa causa entendeu não cobrar despachos, direitos e outras formalidades,pedindo ratificação à mesma. Desta informação receberá a total concordância de D. João, Regente do Reino.

Ora o espantoso facto lateral que sempre me meteu terríveis engulhos, foi meu Pai relatar-me que tal(a entrada da esquadra) se ter processado em hora e meia. Como terá sido possível ?!.Que precisão e arte de bem velejar não teriam sido necessárias para meter 41 embarcações de elevado porte ,à vela, dentro da barra( e fundear com disciplina, manobrar já no interior etc. etc.),em tão pouco tempo? Eu, que apreciei tantas vezes os lugres bacalhoeiros quando, regressados da campanha dos mares do norte e já com meios auxiliares  de reboque, e as dificuldades e tempo, necessários, quando se juntavam dois ou três numa mesma maré, espanta-me como poderia ter acontecido aquele record com 41 navios!

Mas certo é que, posteriormente, passaram-me pelas mãos inúmeros documentos que atestam o feito. São vários,e de diversa fonte, os documentos que confirmam este espantoso acto de elevada perícia náutica. Adiante…Continuemos na 2ª Invasão…e por aqui.

Garantido o abastecimento aos exércitos libertadores, o primeiro confronto deu-se entre Albergaria-a-Velha e Albergaria a Nova.Iniciado às 4-30 horas da manhã, viria a terminar, rapidamente, às 10 horas. Os franceses, vencidos, recuaram para Pinheiro da Bemposta e Oliveira de Azeméis. Sempre acossados pelos ingleses, refugiaram-se em Grijó, de onde tiveram que fugir á pressa.

É destes episódios que ressaem dois acontecimentos (sem referir o anterior desastre da Ponte das Barcas,em Março de 1809) dignos de registo. Um dramaticamente lamentável ,quando o General Thomières (francês) ,na Arrifana ,mandou sortear 71 mancebos e os mandou fuzilar de imediato, por pura retaliação.

Outro, de espantoso cinismo, aconteceu quando os generais franceses jantavam lautamente no convento de Grijó, outros dizem, no Palácio das Carrancas, avisados de terem os ingleses á perna , tiveram de interromper o repasto, à pressa, e fugir, lestos, mesmo com o estômago a dar horas, salvando a pele. E o facto é que estavam tão perto que foram eles (os ingleses) que deram cabo das vitualhas, já na mesa, ainda fumegantes..

Soult é obrigado a abandonar o Porto que é finalmente liberto do invasor. Que atravessando serranias irá refugiar-se na Galiza.




                                                                           Soult

Terminava a 2ª invasão.

Retenho ainda de então, uma série de explicações: porque teria Napoleão invadido Portugal? Várias… e se calhar nenhuma em especial. Precisava dos portos portugueses por onde passava uma boa parte do comércio europeu (quase 10%)? Esperava Napoleão ,como em Espanha, obter a capitulação do Príncipe, e assim tomar de bandeja as riquezas incomensuráveis do Brasil? Teria sido a retirada  do Regente uma decisão«estratégica» ou uma simples fuga para o Brasil?

Quando foi exigido a Portugal ,por Napoleão, integrar-se no Bloqueio Continental, Portugal precisou de
grande perícia diplomática para não afrontar os ingleses,adiando a decisão. Se o não fizesse, a Inglaterra apossar-se-ia unilateralmente do Brasil.Mas se entregasse o poder aos franceses, perderia na mesma, a fonte das patacas brasileira.


                                              Retirada «estratégica», ou «fuga» para o Brasil?
Hellas!!! …percebi então que o D.João tinha, assim, justificação para a sua fuga,feita servindo os altos interesses pátrios. Com ele foram 15.000 ( para outros, 7.000) inúteis cortesãos. E assim, aquele futuro rei – algo badalhoco – ,que guardava o comer nos bolsos da casaca de onde os retirava para os comer à mão, subiu ligeiramente na minha (pouca) consideração. Fez bem a Carlota se lhe deu um purgantezito para o mandar desta para melhor (dizem!).

SF (Out. 2011)

[1] Este Junot,  figura com que nunca engracei, tinha apenas 28 anos e teria sido um mero sargento .Quando Napoleão lhe ditava uma ordem  em simultâneo com outras(dizia-se que ditaria sete ao mesmo tempo)  uma bala de canhão caiu próximo. Todos os escribas das ordens fugiram, à excepção de Junot ,que impassivel se deixou ficar do seu Imperador ,comentando «a terra levantada até foi boa para secar a tinta».E com tal dito terá sido promovido a General.

terça-feira, outubro 18, 2011


A BANDEIRA de 1838


A referida Bandeira é descrita por Madahil do seguinte modo :

« A Bandeira que se encontra na Câmara (CMI), é a que acompanhou o batalhão daqui nas lutas liberais de 1838 ,bordada a seda,ostenta a legenda RAINHA E CONSTITUIÇÃO DE 1838,sobre cores nacionais da época(branca e azul) e na fita donde pende a Cruz de Cristo bordada lê-se B. da G.N. de Ílhavo »

Ora parece haver, nestas afirmações, um lapso informativo. A Bandeira, se acompanhou algum Batalhão, tal teria acontecido na Guerra da Patuleia, que teve lugar em 1846. Continuação da participação nas lutas de sublevação da Junta do Porto contra o Golpe Cabralista (6 de Outubro de 1846),e que terá entrado na cidade em 27 de Outubro, sob o comando do Visconde Sá da Bandeira.

Aparecem, assim contradições entre historiógrafos da época.Diniz Gomes - familiar de Rocha Madahil - em «Costumes e Gentes de Ílhavo» ,(II Vol –ed Companhia Editora do Minho pp 93) refere-nos o acontecimento com a data de 14 de Maio de 1844.

Certo é que a Patuleia teve lugar em 1846.

Marques Gomes em «Noticias de Aveiro e Seu Distrito»,parece estar certo quando nos refere a presença do Batalhão no acontecimento de Valpaços, em 20 Novembro de 1846.

Mas duvida que a Bandeira pudesse ter sido levada ,pois, afirma,  não era crível que por ocasião da Patuleia ,o batalhão se apresentasse no Porto com tal bandeira, por nessa ocasião já ali ninguém pensar sequer na Constituição de 1838 (…) mas o grito terá acontecido:

“Portugueses às Armas ! Às Armas pela liberdade e pela Rainha ! (….)

Viva a Rainha ! Viva a Carta Constitucional !... Palácio da Junta Provisória 11 de Outubro de 1846.

Marques Gomes poderá ter razão.

Mas certo é que a revolução da «Maria da Fonte» sendo um movimento espontâneo, bateu-se contra a lei que impedia os enterros nas igrejas (Lei de Saúde) e contra a reforma do sistema tributário(os papeletas da ladroeira), pretendendo um regresso ao antes de 1842,ao sufrágio directo, o que significava o abandono da Carta .

Pelo que pensamos não estaria tão deslocada a «Bandeira da Constituição de 1838».É pois, possível - ao contrário do que afirma Marques Gomes - que tivesse sido levada aos campos da batalha pelos Setembristas de que eram apoiantes, Alberto Pinto Bastos e o irmão Augusto Ferreira Pinto Bastos(comproprietários da Fábrica da Vista Alegre), que integravam a Junta Governativa.

Outra situação diz respeito ás razões porque teria aparecido esta bandeira com estas inscrições, pois, refere Marques Gomes, existem duas e só duas portarias, determinando as inscrições na Bandeira da Guarda Nacional .



A primeira portaria, de 29 de Março de 1834 (art 6ºe7º), determinava que cada Batalhão tivesse uma Bandeira,azul e branca, com a legenda “ Rainha e Carta”


A segunda, a portaria de 14 de Setembro de 1836, pretende que a inscrição acima passe a “Rainha e Constituição de 1822”


Depois disso nunca mais existiu nenhuma Portaria a fixar inscrição diferente, das referidas .A inscrição inserindo o ano de 1838 ,não teria, pois, validade comprovada.

Como teria,então, aparecido a Bandeira do Batalhão de Ílhavo (da V.A)?

Marques Gomes sugere que a mesma é apócrifa “resultante do afecto de alguns ilhavenses por estas ideias

Poderia de facto assim ter sucedido :– os irmãos Pinto Bastos tê-la-iam mandado executar (bordar ) e acharam que a mesma, e os ideais que representava ,poderiam ser válidos para acompanhar o Batalhão dos Artistas da V.A. Independentemente de ter, ou não, validade fixada por decreto .

A Bandeira, que foi entregue à Câmara Municipal de Ílhavo juntamente com as quatro condecorações atribuídas ao Batalhão e ao seu comandante, estará , agora, no Museu .As condecorações ,parece ,ninguém sabe onde param; ou pelo menos ,ninguém sequer me soube informar de que conheceriam a sua existência.



Senos da Fonseca



2007

sábado, outubro 15, 2011


Pode um velho ter direito à indignação…ou tão só à resignação?

A onda ,o tsunami que aí vem – as imagens esclarecem como se forma a tempestade perfeita –, é um movimento de jovens indignados. Por isso não se diluirá. Crescerá até se tornar desbastador.

No meu tempo a indignação tinha um inimigo absoluto, único: - Salazar ,e o estado fascista.

Pelo menos tinha sentido.Era pacifico e não enganava ninguém : uns dum lado, outros do outro. 

Ora a indignação ora iniciada, não é contra o sistema – ninguém quer perder a democracia – mas tão só contra os que o servem (mal).O guião serve;quem não serve são os actores.

E não se apressem uns «patriotas» a embarcar, algures, na próxima estação, porque a hora é de desembarcar e não de embarcar. É hora de acabar com esta farsa em que temos vivido (nós e os outros lá por fora), a de uma pseudo democracia. Esta é a palavra de ordem do movimento espontâneo: -acabar com a « farsa da democracia» em nos deixámos emalhar. Que é apenas uma caricaturara do que deveria e poderia ter sido.E por esse equivoco,  todos nós, os das gerações anteriores, somos responsáveis. . Fomos traídos ? Talvez….mas isso não nos desculpa.

Mas deixem-se de sonhos: nós já não temos lugar no comboio. Resta-nos aconselhar esta geração que se não deixe enganar, como nós fomos enganados.Isso não será de menor importância.

A democracia, é hoje evidente, não se alcança com os partidos, mas por uma representatividade muito mais sã e próxima. De compromisso, responsável, e com rosto.

Talvez seja verdade que nem todo o tempo foi de pura perda. Talvez estejamos a ser alinha avançada, a «carne para canhão», numa batalha que perdemos, de uma guerra em que os vindouros vencerão.Outros o fizeram ,também,por nós.

A conclusão a que já se não pode fugir,é só uma: se isto é democracia…não serve. Reinvente-se,pois, uma «nova»,uma outra democracia.Com  pessoas (o individuo nunca se sentirá pessoa  antes de se sentir e assumir,cidadão)  e não com marionetas manipuladas por detrás da cortina.

E como vai acontecer ? …pois: - com uma outra revolução. Não se duvide. Pacifica ao princípio…violenta se não for às boas.

Ela está aí, em marcha. Só uns desatentos poderão pensar que isto não vai dar uma cambalhota de todo.

Em 25 Abril de 2010,na costumada versalhada evocativa, eu prenunciava:

(....)
Num outro Abril qualquer

A gente ainda saberá o que quer

Ainda saberemos dizer não …

(...)

Por isso não me resigno. E se eu já não posso (não tenho o direito de) sonhar,pelo menos torço para que esta cambada não tenha mais uma hora de sono …

Mais uma vez acredito; perdi muitos sonhos.Mas sempre na esperança de que ainda iria adormecer embalado pelas trombetas que anunciam um novo caminho para chegar ao ideal da esperança. Utópico? Talvez…que se lixe…
Este é o primeiro dia  do resto...deixem -me que para ele olhe com um olhar de inocência cristalina.  

SF (15 Out 2011)









quinta-feira, outubro 13, 2011


A deficiência está apenas na diferença.



A vivência diária, directa ou indirecta, com a deficiência,deu-me um conhecimento mais aprofundado no entender de uma parte da natureza humana.

Hoje tenho uma noção clara de que todos, em maior ou menor grau, somos deficientes.

Por isso abomino essa palavra. E substituo-a por «diferentes».

A vida no seu exercício é um fardo; um cumprimento, ou incumprimento, de vários parâmetros.

Julgo que todos – ou quase todos – ao querermos afirmar a nossa sã mentalidade, não fazemos mais do que tentar maximizar os diversas posturas – parâmetros - de vida no lidar com «todos». Podemos ter uma mente muito forte (inteligência vocacionada), cheia de atributos (ferramentas), para isto ou para aquilo em especial, sem que isso signifique que temos os (as) suficientes para viver a vida no seu todo. E porque esse dito «ferramental» é sempre, nisto ou naquilo, deficitário, a vida é, no extremo, um fardo.

Neste negócio de postura há maus desempenhos. Eu aceito-me um deficiente em relação a determinadas posturas. Veja-se: não saber conviver com o poder -não sabendo por mais esforço que faça dizer, sim! quando devo dizer, não!; não saber curvar-me para obter qualquer beneficio;sentir-me bem melhor na pele de devedor que na de credor; não saber trocar de amizades – ou acrescentá-las – só por conveniência.
Sei de uma maneira clara, assumida, quanto sou intolerável para os que mais quero, quando estes me desiludem. Mesmo nas pequenas coisas que tolero aos outros. E constato a minha deficiência que me não deixa auto-corrigir, sobrepondo-se à minha racionalidade (e muito mais haveria a dizer…)

Enfim: sou um «deficiente profundo» na lide com a vaidade material humana.

E por isso, é verdade, sentir-me cansado por tentar ser «normal». Andar anos e anos, a fio, a parecê-lo, que não a sê-lo.

A pureza dos deficientes é algo de belo. Percebe-se ao fim de uns tempos.

Um exemplo: aqueles que cumprindo uma tarefa lidam com os «diferentes», por norma, apegam-se, criam laços profundos com eles, muito mais sólidos e intensos, por vezes, que os demonstrados pelos familiares directos.

Já o não é assim – de modo nenhum! –, naqueles que lidam com os «sãos» no seu crepúsculo. Por que nessa fase da vida é mais nítido que afinal somos todos muito mais semelhantes.
Incrivelmente semelhantes, na exposição da deficiência que levámos uma vida a esconder.



SF (Out 2011)

domingo, setembro 04, 2011


Hoje ,dia do S.Paio primei pela ausência,cortando com o ritual.

Mas para os que não sabem aqui vai saborosa prenda

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ONDE SE DÁ CONTA DOS

ACONTECIMENTOS

DO



«ROUBO» DO S .PAIO.



PERPRETADO PELOS IRREDUTÍVEIS «ílhavos» DE NOVECENTOS

E DE Como



REAGIRAM OS «murtoseiros» A TAL AFRONTA






O «desvio» do S.Paio da Torreira



Onde se dá conta a aventura dos «ílhavos» no rapto do orago galego
Um dos episódios mais rocambolescos, praticado pela irrequieta rapaziada de Ílhavo, de então (primeira década do século XX), foi o «roubo» do S.Paio. Esse orago menino que vindo lá da Galiza – há quem afirme que a imagem deu à costa no mar da Torreira – se tornou santo (afamado) protector das gentes daquelas beiradas, sita lá para o norte da laguna. A festa do S. Paio, com destaque primaz no calendário das festas mítico-pagãs da ria, justificava presença obrigatória para renovação anual da crendice dos devotos, na boa e pronta intercepção do orago nas veredas nem sempre fáceis da vida destas gentes tementes, mais a Deus do que ao mar. A devoção é pior que sarna : atrás de uma coçadela logo apetece outra. Por essa razão os festejos em honra do santo virava verdadeiro estendal, cardápio recheado de gentes vindas de todas as hansas esconsas da Laguna, arribadas nos moliceiros, mercantelas, mercantéis, chinchorros e outras embarcações requisitadas para o efeito. Tudo quanto vogasse e onde coubessem as gentes mai-las cestadas de conduto - que a demora era para três dias e a madrugada já entrava na conta. Sem esquecer as essenciais e indispensáveis «canadas» de vinho, fartas e bem atestadas do precioso néctar bairradino – e mesmo do «enforcado» se posses não houvera para o dito – que a esturriqueira do Sol, o afã do bulício do arraial e o desentaramelar da língua a pôr em dia as novidades e trautos, fazia secura maior que baixa mar de maré viva.



Era tradição de então, cumprida a rigor, dar banho ao orago, regando-o a «tinto» em celha botada junto ao altar para o banho santo – bendito sacrifício! – para o qual todo o bom romeiro contribuía, despejando-lhe, cabecita abaixo, um bom quartilho da melhor pomada embarcada, previamente benzida - in nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti Amen…verte, dizia o tonsurado assistente.

Tão copioso era o baptismo, que o santo-menino apesar da presteza das devotas irmãs virgoleiras que acorriam a secá-lo com toalhas franjadas, debruadas a bonitas bordaduras, executadas do mais alvo e virginal linho, apresentava já, uma arroxeada maquilhagem que não escondia a farta –

ainda que santa – undação vínica.



Da Costa Nova, mal o dia despontara, e quando ainda o sol não dourara a natureza, já um grupo de irreverente rapaziada, bem aperaltada, folgazões inveterados, se aconchegara em barca fretada para demanda daquelas paragens lagunares, encalhadas lá para a beira das quintas do norte.

A meio da emposta laçara-se vara aos golfiões, baixando-se o velame. Com o envergue armara-se estendal por debaixo da qual se atravessou a toste para fazer de mesa.Sobre a qual, suspenso do cambador, baloiçava o pipo, de modo a facilitar o acesso à torneira, ali à nassada de uma mão, para atesto dos pucarinhos que se requeriam sempre cheios. E enquanto se esperava pela reponta da maré, preparara-se a bordo uma raia de pitáu, uma daquelas iguarias que levanta o moral dos peregrinos, se bem molhada para atenuar as agruras dos gorgomilos queimados pelo apimentado da sua molhanga, precioso auxiliar do orago no alivio aos que sofrendo de nó da tripa, a ele se dirigem solicitando, a sua desatadura.

Prosseguiu o repasto no “copo a mim depois de ti” – que neste jogo o empate é regra – e do meio da algarviada surge a dicha. Claro que o autor teria de ser o Manuel Mano, useiro e vezeiro em tropelias do género, um verdadeiro agitador com larga folha de serviços no registo de acontecimentos de perturbação da concórdia pública.

O desaforado propunha-se, nada mais nada menos, a raptar o S. Paio, trazendo-o para junto da Nª Srª da Saúde, deste modo acabando, dizia, com a primazia da melhor festarola. E quem sabe, pensando num possível «enlace» dos dois santinhos, pondo fim à solidão a que nem Santo consegue fugir. Há quem diga – vá lá saber-se a justeza de tal dedução – ser essa a razão da escassez dos ditos!....

- Que nem pensasse em tal asnada ! ..., advertiram os mais sisados. Se é que queriam voltar com o canastro inteiro, à Costa Nova.



Já no arraial, rodeando a celha para dar cumprimento à promessa do banho ao santinho, logo o Manuel Mano, o inveterado brincalhão, aproveitou a confusão da rega vínica para surripiar o santo, enfiando-o no bolso do varino, largueirão e abotoado de cima a baixo, do camarada Zé Guerra, sem que este se apercebesse do facto. Lesto, logo o puxa para fora da Capela, e só cá fora lhe segreda o feito. Era mais que tempo para abandonar o local do crime, pois que ninguém, ao que parece, no estricote, se tinha (ainda!) apercebido, de imediato, de tal ousio.Tão caudalosa era a torrente despejada sobre o orago que nada deixava ver, névoa tinta rubi cerrada, esparramada na celha..



Mas não há pecado que sempre dure: - antes houvera, que a vida seria bem mais gozona!



E a confusão estalou. Gritaria daquele maralhal de gente alvoroçada, um babaréu dos demónios espicaçado pelos sinos repuxados a rebate. Num verdadeiro despautério, clamava-se :



- “Aqui del Rei que o S.Paio sumiu-se” .



Obra de Galegos infiltrados – pensou-se – que teriam vindo resgatar o santinho da sua terra.

Logo se vasculharam as caras dos circunstantes, pretendendo-se com isso descortinar sinais dos ditos, que por serem gente de parentesco tão próximo – os nossos antepassados foram frequente visita daquelas bandas, deixando larga prole nas galegas perdidas na solidão dos seus homens ausentes, metidos nas guerras infindas de Castela – todos e nenhuns, o pareciam ser. Do santo nem o cheiro, pois se algo tresandava por aquele corrupio de gentes, e empestava a atmosfera, esse era o da vinhaça que fartamente tinha sido emborcada pelos folgões peregrinos, senhores de apurados dotes destilatórios.



Foi então que um murtoseiro mais atino dá de olhos no peregrino que em dia de esturreira se cobre, desconforme, com pesadão varino.



- Ná !... - pensou o catita - que promessa tão aziada, só para redimir pecador de tamanho calacre.



E se melhor o pensou, mais rápido desfez a dúvida, estaqueando à navalhada o varino do Zé Guerra, burel feito em fanicos, deixando o pobre «ílhavo» em manaias, exposto à devassa do olhar habitualmente guloso – mas no momento mais inclinado à vingança que à gulodice – das belas murtoseiras, a que nem o buço da benta é capaz de reduzir o feitiço das amêndoas apetitosas coladas no rosto. E o pobre do Zé Guerra, que lá ficou em posição tão escurra, especado em ceroulas, rodeado por tantos sacripantas de olhares contaminados prenunciando feroz vingança, deitava contas à sua sorte, ao tempo que pudicamente encobria as suas expostas intimidades, que certo era, correrem verdadeiro risco de serem separadas do dono, tantas as naifas que bailavam ameaçadoras, em frente do seu olhar, diga-se, um pouco inquietado. Pudera ! …um escrivão de tribunal metido em tal alhada …Um homem capado não era lá muito aconselhado para cumprimento da tarefa que exige uso intensivo da «caneta»…

Valeu a pronta reacção do resto da rapaziada de «íbalho», que logo rodearam o companheiro inocente, decididos em o protegerem da turba açulada. Dando-lhe para isso as costas – que é o máximo que um homem pode dar por um amigo –, incharam o peito à turba mostrando-se arrenegados, dispostos a castigar a desfaçatez insultuosa de uns tarolos que ousaram pôr um «ílhavo» a exibir, na via pública, as suas partes podengas, por mais viris e prometedoras que fossem. Varas, varapaus, estadulhos, navalhas, tudo serviu para fazer frente à horda dos espoliados do Santo, que julgaram por bem medir o grupo daquela gente cuja fama de tesura era história por demais conhecida por toda a laguna. Balbúrdia delirante da horda, que arrecuando, sempre ia gritando ….



- Matem-nos!… Capem-mos!… Cortem-lhe os ditos!..., gritava endoidado o mulherio açulado, em estrilo estremunhado que se ouviu – constou ! – no Rossio, em Aveiro.

Olhai! : - a vergonha do gozo dos cagaréus… Já nos não bastava a história da Lâmpada.

Um banho de sangue estava prestes a eclodir. Com tal sarrabulhada, previsível, pretendia-se regar o S.Paio e com a mesma lavar a sua honra –de criança! – só que desta vez em representação real, com sangue igual ao de Cristo.Pois só dessa maneira, vertido o sangue dos profanadores do templo – gentes de pacto com o diabo! –- se conseguiria a remissão para a afronta dos hereges.



Valeu estar por ali em peregrinação mais pacifica, o então Administrador do Concelho de Ílhavo, que fez valer as suas prorrogativas de chefe das Ordenanças, e com o seu vozeirão deu ordem de prisão ao «maralhal dos larápios», recambiando-os para Aveiro, onde prometeu, lhes seria aplicado severo castigo. Assim prometeu e assim se confiou na palavra da autoridade. E a barca lá carregou os infiéis, a caminho do degredo.Com tal decisão exultaram os murtoseiros.

Claro que se tratou, apenas e só, de uma manobra de diversão, pois o Regedor, Sr. José Vaz, fazia, ele também, parte do grupo. Passada a ilha de Sama, logo a barca rumou à Costa Nova onde desembarcou os desavergonhados sacrílegos, recebidos em verdadeira apoteose, como heróis. Pois a noticia correra célere com o vento.

À noite, no Salão da Assembleia, a peripécia foi contada (asseguro a Vossorias, como vo-la conto, só que com mais pormenores de tão frescos estarem os acontecimentos) regada por cântaro de palhete bairradino, daquele que parece veludo enquanto banha o céu da boca dum mortal, até se escapar, goelas abaixo, para regar o repasto - Chambão das Maias da Pedricosa mai-los Petits Poissons de La Lagune en sauce de vinagrette- que o acontecimento exigia capricho na nomenclatura das vitualhas. Acorreram as mulheres dos heróis, as primas das mulheres, as amigas das primas das mulheres, todas!...as mulheres, a quem saltavam aos olhos – libera me domine – que forneceram adequado enquadramento à alegre bailação. Juntos, com o regedor, bailaram até de manhã. Até que o cântaro ficou vazio
Certo é que para aquele grupo, o S. Paio acabou-se.


 
Nota do contador - Tendo-nos vindo parar às mãos uma fotografia dos brincalhões por amável deferência do filho de um deles - O Cap. Manuel Guerra - logo a entregámos ao Cap. São Marcos - verdadeira caixa de memória viva - para que nos identificasse o grupo. Nem de todos, tal, foi possível fazê-lo. Pode ser que venham ajudas, agora que a fotografia aqui fica para a História.






1. Labrincha

2.

3.

4.

5. Ademar Ramalheira (Piloto da Barra em Lisboa).

6. Marcos Ramalheira (Penhorista em Lisboa, futuro proprietário da vivenda «S. Marcos» na Costa Nova).

7.

8. Ângelo Chuvas (Funcionário da Vista Alegre)

9.

10.

11. Prof.Remígio Sacramento (Casado com D. Georgina Ramalheira irmã do Prof. Guilhermino Ramalheira).

12.

13.

14.

15. Zé Guerra (Escrivão do Tribunal de Aveiro, pai do capitão Manuel Guerra).

16.

17. Prof. Marta (Sogro do Dr. Alcino Couto)

18.

19. Eduardo Craveiro (Ourives e relojoeiro, pai do Dr. Eduardo Craveiro).

20.

21. Manuel Mano

22.

23. Eduardo Ançã (Futuro Director Geral de Finanças)

24. Manuel Sacramento (Casado com a D. Silvina funcionária dos CTT de Ilhavo).



Senos da Fonseca

2007


terça-feira, agosto 30, 2011

Este mundo está,deveras, perigoso….



Bem Vos tenho dito e avisado: os deuses devem estar loucos para consentir tais desmandos.

Então agora não se apregoa o fim dos «ricos»?

Ora isto preocupa-me:


1- Porque acabando os «ricos» acaba-se com os «pobres». Evidente. Só há «pobres» porque há «ricos».

Passando os «pobres» a ser considerados – «ricos» - será tempo de os esmifrar  até ao tutano. Os mesmos de sempre, sacarão da cassete e apregoarão : os «novos ricos» que paguem a crise». A bíblia bolchevique di-lo e a luta de classes continuará até ao último dos novos  «pobres ricos».



2- Mas preocupa-me ainda mais que sejam estes novos «pobres ricos» que tenham de sustentar os «velhos ricos» que aceitaram empobrecer.Sorridentes, colaborantes, e sem fazerem um manguito.
Poderemos então de  criar uma nova taxa que vá permitir que os ex-ricalhaços continuem ricos a valer.Por assim o merecerem. E há o perigo de que, como trabalhadores (Amorim dixit) venham pedir indemnizações por despedimento de classe, o que poderá atingir números assinaláveis.É mais fácil um tubarão comer carapau em vez de cherna,que um rico dispensar a sua dose diária de caviar.Desconfiem...   

3- É verdade! Ou pelo menos parece: - os «ricos» anda por aí  a oferecer-se para dar uma corda a quem lhes der um porco (cevado).

Eu ando preocupado porque com este abaixamento de ratting ainda um dia posso aparecer, na Forbes, entre os mil «pobres ricos», e exposta a minha fortuna em dez patacos furados.

Não podem voltar atrás e arranjarem um subsidiozinho para manter os «ricos» ainda mais «ricos»?

Se os «pobres» já se habituaram a pagar as crises (esta e todas)…porra… é só mais uma.

E os rapazes ricalhaços lá continuariam a carregar com o fadário. Porque isto de se ser

«podre de rico» deve cheirar que fede.



Aladino

terça-feira, agosto 16, 2011

E hoje a noite apossa-se de mim.

Desta minha janela, lugar de privilégio que idealizei e fiz para mim (e para mais ninguém) vejo acontecer a tarde estranhamente escura. Plúmbea, tristonha, toldada de uma luz pardacenta que parece – só! – existir superficialmente. Olho e pareço tentar perceber este estranho determinismo que leva a natureza a comportar-se como um ser humano. Tão risonhos éramos ontem, esquecidos da amargura de ser consciente quando não fingimos. Sofre-se sempre mais com a consciência de que os outros sofrem, do que com a ilusão que só nós é que sofremos.

Hoje não encontro nada de belo no que me chega e envolve. Indisposto, vou e fecho a janela. Tento assim ficar só eu ….comigo , com a minha realidade interior. De fora não vem nada que me ajude a acordar. A perceber que uma flor qualquer está neste momento a despontar, não sei em que jardim. De certeza num jardim que não é o meu. Ligo a música: espero algo que me alimente e desperte, e me crie a ilusão de que não vale a pena pensar.

A tarde está tão carregada que as minhas penas com ela comparada parecem (tão) leves. E bondosas. Hoje não virão as estrelas. Das serranias a luz alourada da ria não virá fazer a estrada que vem bater no meu degrau. Será uma noite de luar oculto, noite adormecida cheia de nada.

A ria está um molhado indiferente. Sombras aqui e ali recortadas, sonolentas, carregadas de uma monotonia inquietante. Não há cheiro. Nem sequer há vida. Até os barquitos desapareceram. Ah! se eu me pudesse como eles amoirar, e, indolente, deixar-me rodopiar numa valsa à deux temps» a sonhar com o me substituir a mim próprio?!

Tento ficar desperto, a pensar sem pensar. Pois só pensa quem é iluminado por dentro.

Já nem os poentes fazem vogar em mim as caravelas da descoberta. Parece que já não consigo descobrir nada lá fora, pois já nem em mim descubro coisa que valha.

Estou farto de mentir para o prazer, para a glória, para o poder (tudo a que miseravelmente não consegui escapar apesar de de tudo). Só desejo em cada dia que passa, ganhar a liberdade de ser eu.

Tudo o que faço para fora de mim me parece inútil.



SF Agosto 2011

quinta-feira, agosto 11, 2011

Andorinha do mar




Detenho-me

Neste fim de tarde ensolarada

Sentado no murete que me separa da ria

Encho os olhos com o azul vivo das suas águas.

E trago lá de longe as asas da gaivota que graciosamente

Esvoaça.

Conto uma a uma as conchas sem perceber

Para onde foi o seu morador.

E desperto com o chap- chap da tainha que me faz negaças.



Sentado aqui, solitário, vejo mais céu.

Intriga-me esta enormidade sem fim

onde as estrelas se penduram.

Sinto no confronto com a sua grandeza

Que a vida parece custar menos, a mim.

Ou que é menos fria, e que nela há (ainda) acenos frescos:

Uma andorinha do mar veio pousar a meu lado.

Apetece-me viver apenas com os sentidos.

Sentir sem possuir, guardar cá dentro;

A vida na essência do momento.



SF (Agosto 2011)

sábado, agosto 06, 2011

Nestes acode-me revisitar a dupla,inenarrável

PITATO& BENJAMIM, Ltd


Em final da década de cinquenta era habitual ficarmos por ali, junto ao café TAMAR, (actual Luso) a conversar até altas horas da noite. Saber quem levava a chave, era saber quem eram os últimos a recolher a penates.

Entre os contadores de estórias, no inicio da noite, tinha lugar privilegiado o «Benjamim Pardal», que era a delicia de todos nós, tantas eram as patranhas recriadas, inventadas ou concretizadas, por esta figura que juntamente com «O Pitato», constituíram um dos mais famosos e mais conhecido, duo de manipuladores de simpras, crédulos, que embuchavam qual bacalhau esfomeado por sandilho, toda a trapalhice com que aqueles estimáveis «malandrecos» os engodavam.



Eram duas boas pessoas, apesar do muito que se badalava.

O feitio de brincalhão, impenitente e compulsivo, fez com que Benjamim, oficial náutico, nunca tivesse ido além de Piloto. Porque mesmo no desempenho desta responsável tarefa, e em ambiente tenso da dureza da pesca, não deixava de exercitar os seis dotes de enloilador – mor.

A ponto de numa viagem ao bacalhau ter convencido a tripulação que a má pescaria, feita até ali, advinha do facto do Sr. Capitão estar possuído por alma penada, sendo necessário para virar a sorte, «picá-lo», para assim o libertar do Lúcifer que dele tinha tomado conta. E o certo é que a dada altura a tripulação embuchou o isco e anzol, e fez praça à porta do camarote do capitão, de navalha na mão, dispostos ,caridosamente, a libertá-lo da maleita. Não fora a intervenção de um nosso patrício (Sr. Parada) e o Capitão -feito lobisomem - ver-se-ia em apuros para evitar a picadela – a sangria – mais que certa...



«O Manuel Pitato» – o mais ferrenho belenenses de Ílhavo, depois de mim!!, emblema de ouro e brilhantes do Clube de Belém – era o fiscal do Mercado Municipal. Juntamente com o «Manuel das Senhas» zelava pela recolha das taxas que as, tiGalante, tiPata e a ti Tuna, e outras, tinham de pagar para exercer a venda dos produtos, na praça. O «Manuel Pitato» seria, aliás, a figura central de uma monumental polémica da politica local, ocorrida ao tempo da Câmara de Dinis Gomes, que se dizia ser seu Padrinho. Da auditoria ao modo como vinha desempenhando as suas funções, resultaria ter sido castigado(?!) com a ida para a Costa-Nova, para aí exercer as mesmas funções de zelador, no novo mercado local. Diga-se que foi castigo(?!) que apreciou em particular, pois logo a dupla Pitato&Benjamim trocou a «Gruta» pelo «Coração da Praia», para, no salão deste último, disputar renhidas «suecadas».Houvesse – e até havia! - quem se atrevesse a aceitar o desafio da temível parelha.




     
                                                           O BENJAMIM PARDAL

Os Pitato & Benjamim tinham jogo perfeitamente combinado.

(…)

-Atão compadre, como estavam os tomates do tiPio? …perguntava com naturalidade o

Benjamim.
-A cinco a dúzia -respondia o Pitato, a dar o sinal de que tinha cinco trunfos.
-Mas então ontem não estavam a sete?.. compadre...ia dizendo o Benjamim enquanto encartava o jogo, querendo com o relambório perguntar se o colega tinha o sete (a manilha).
- Pois era …mas era ontem – retorquia o Pitato, querendo dar o sinal que não senhor, não a tinha.
Sempre que a xita (o fazer a totalidade das vasas) era evidente, «Pitato & Benjamim» levantavam-se, cumprimentavam -se reverencialmente, e iam cantando:

-Dictum et factum, depenato est,
-Dominum Vos bispo….
-Domi suae est rex
-Et spiritoò… Oremos…

-Amem!...Amém – e batiam a ultima mão na mesa, perante os adversários que, apalermados e fragilizados com tal retórica, por vezes desistiam, ali, na hora.
Os mapas onde iam apontando – e traçando quatro a quatro (como os almudes) – as mãos, eram de regalar a vista; quando sucedia a xita, e conforme esta se tinha desenrolado, havia direito a pintar o diabito de cavanhaque e, até, de cavanhaque e rabo. Eram verdadeiras pinturas naifs de que alguns guardavam amostra, e outros tentavam, sem êxito, imitar.
(…)
Ora um dia o Cap. Zé Negócio abordou-me para me dizer que o Benjamim tinha convencido um «vagueiro», que andava por aí à solta um lobisome; só que –teria dito o Benjamim – não havia picadores em Ílhavo com «os ditos» suficientes para libertar o desgraçado da alma penada que o mortificava. Logo o rústico, ao ouvir o queixume do Benjamim, que punha, entretanto, uma cara de compaixão pela inditosa desgraça do olarapo, ao tempo que levava o tabaqueiro aos olhos parecendo, assim, limpar uma lágrima vertida, se alteava e alorpado, ia dizendo chançudo:

-O que é lá isso; pois saibam V. senhorias :- se querem um picador ele aqui está à vossa frente. É só dizer o sítio onde se mostra a alma penada.

(….)

E logo se combinou uma tramóia; um pipo velho que enchi de água, um frasco de mercuro-cromo retirado do stock da farmácia, uma corda longa fornecida pelo Capitão Zé, e, à meia-noite, lá fomos para a estrada das Oliveiras. Pusemos o pipo no chão ligado ao carro pela corda, e uma parte do grupo foi esperar o picador. O pobre homem lá apareceu, montado na bicicleta, munido de três grandes varas terminadas por espiche. Mostrado o lobisome – o pipo! - o rústico empunha a vara lançando-se como doido… e zás … espeta o barril. Eu arranco com o carro. O pipo aos baldões, salta, rebola, pincha e escangalha-se no paralelepípedo, desfazendo-se em sangue (água e mercurocromo).



Até ali o espectáculo não poderia ser mais fantástico. Inenarrável.



Só que, de repente, o lôfo vagueiro cai redondo a espumar pela boca, apopléctico, parecendo atacado por alma penada. Um escarcéu dos diabos. Rodeámos o homenzinho, e vá de saber o que se devia fazer. Galheta para aqui, abanões para ali e, valeu-nos, um farsante presente que se lembra, felizmente! – do Sr. Mário Lau – que tinha uma tasca ali ao lado. Lá se bateu à porta do dito, e, com um gole de cachaça enfiado pelos gorgomilos abaixo, o «vagueiro» veio finalmente a si. E de olhos esbugalhados, num esgar patético logo gritou:

-piquei-o…piquei-o …era o bruxo da Pedricosa. Eu sabia!..eu sabia! – gritava com o estupor estampado na cara.



Lá recompusemos o sacripanta, e, enfiada a bicicleta no AL (matricula do Ford) lá o fui levar a casa.

(…)

Claro que depois a história durou até de manhã. A garrafeira de meu pai estava lá para nos preencher as noites. E o canário, que na sala de jantar chilreava assim que se acendia a luz, sossegava -o:

- Dorme Eduarda que eles já estão cá dentro, aquietando, assim, a minha Mãe.

(…)

Mas voltando ao Pitato & Benjamim.


                                                             

                                                                        «O Manuel Pitato»

Um dia de Outubro, no «Coração da Praia», a dupla defrontava uns maçaricos que cedo mostravam não estar à altura de se bater com tão sábios suequeiros.Em volta da mesa iam-se achegando uns matolas que por aquela altura vinham a banhos, aproveitando para apreciar o desenrolar do match (ainda não havia ecrãs panorâmicos ). Um deles, um bisnagau com cara de finório, foi logo notado pelo Benjamim.Que não perdeu a oportunidade:

-Pois atão (?!) que me diz, compadre, daquela baleia que ali deu à costa – atirou em ar natural, para o Pitato.

-Homessa! compadre Benjamim, nunca visto, nunca visto. Coisa de Satanás, compadre (dizia benzendo-se, o Pitato). Quinze metros e mais de dez toneladas. Vem aí a tropa com uma cábrea para levar o monstro.

Isco lançado, logo o «matola» quis saber:
-Eh amigos então contem lá, raios!... Não deixem uma pessoa ficar em pulgas
-Oh camarada, «aquilo» nunca visto …. E logo o Benjamim desatava numa lenga – lenga, uma série de trampolinices que acabaram com o escanifrado a dizer:

-Vou buscar a minha Maria e vou lá ver, raios. Nunca vi uma baleia no raio a vida.
E lá partiu.
Para o fim da tarde alguém veio avisar o Benjamim que vinha lá (!) o matola, parecendo que trazia cara de poucos amigos. O Benjamim que armava as trapalhadas mas logo se escapulia se as coisas dessem para o torto, dá por se pôr ao fresco, saindo pelas traseiras do Salão Arrais Ançã.O «Pitato», esse, coitado, dada a sua deficiência, não podia ser tão lesto. Mas afoito, acariciou a muleta, preparando-se para tudo. Chegado o bizarrão, este diz:
-Olhe lá ó camarada: o seu parceiro? -pergunta de um jacto, ao tiManel.
- Olhe como era tarde, já se foi para a missinha. Ele é sacrista, sabe. Mas bom homem, deixe lá a brincadeira; ele gosta de ser brincalhão.

-Ora.ora…não é nada do que está a julgar. Eu vinha, era, agradecer. Está bem que não vimos nenhuma baleia. Mas eu e a minha Maria aproveitámos a maré, e olhe: - demos nas dunas desertas a melhor «cambalhota» da nossa vida. E eu vinha agradecer ao seu amigo, por mim e por ela, e até queríamos convidá-lo para ele ir lá casa provar da nossa pomada.
Até ao fim desse mês ,fim da época dos matolas ,o Benjamim nunca mais apareceu na Costa-Nova. O «Pitato» até pensava que o raio andava mau da tripa, com a jantarada que os bairradinos teriam oferecido ao Benjamim.
Mas passados uns dias apareceu ao «Pitato» ,o bisnagua, inquirindo:
-Oh camarada : - você sabe onde pára o Sr. Cap. Benjamim? È que ele prometeu levar-nos a voar no avião do «seu amigo» Zé Cadengo, e nunca mais apareceu…
Escusado será dizer que o Benjamim desapareceu da Costa-Nova. Dizia, na «Gruta» a quem o queria ouvir, que os ares do mar, nesse ano, estavam muito fortes, perigosos para a sua frágil saúde.

Era assim a dupla Pitato& Benjamim. Estaria aqui até amanhã a contar estórias, petas e tretas, saídos da imaginação delirante desta parelha de verdugueiros.

SF

            Os nós da vida.... ..  INQUIETUDE... A VIDA COMO ELA É ...  Neste cantinho recomendado que, a natureza prodigalizou, e que a e...