Ao que ouvi,a CMI vai festejar no próximo feriado Municipal(segunda
feira, dia 2 de Abril-felizmente não é dia 1!),com pompa e circunstância a Regeneração do Concelho de Ílhavo .Uma
espécie de libertação ,talvez no seguimento (parecem fazer crer) de terrível e
sangrenta luta acontecida nas Ribas Altas, luta fratricida que “libertou” do
jugo “cagaréu”, o concelho.
Esta versão já a ouvi de bocas de “historiadores” encartados,
daqueles mestres que põe nas suas frases circunloquiais, o saber académico que
prece intocável.
Creio que fui,no meu Ílhavo
Ensaio Monográfico -.Séc- X ao Séc.XX – a primeira pessoa que coloquei ,em
termos públicos, a questão, que nada teve de anexação desejada por Aveiro, mas
tão só resultante de uma decisão politica a nível central, de carácter
administrativo, que expus, então.
Julgo útil recolocar aqui a questão, para termos da história
uma versão menos panegírica e menos demagógica, levando a distorcer a questão. O
meu Pai bem insistia” a História é feita
de factos; mas cada facto tem a sua história. Há que ter cuidado e conhecer os
factos e as razões, para se não distorcer a história”(isto a propósito
da delirante questão da “mentira” que é o chamado Brasão de ílhavo.
Adiante. Passo a transcrever o que exponho no Ensaio Monográfico :
Em 1865, à profunda crise política
viria juntar-se a pior colheita agrícola de sempre. O desemprego e a
criminalidade atingem níveis nunca alcançados. O país via nos suicídios
individuais que, grassavam por todo o lado, a aproximação do suicídio
colectivo. Os tumultos surgem por toda a parte.Em particular pela região de
Aveiro, com o povo a indignar-se contra o imposto de consumo, entretanto
criado. Tentado um plano de emergência e de estabilidade, não se vislumbraram,
contudo, quaisquer consequências positivas. Importadas do exterior vão chegando
as críticas demolidoras do liberalismo. Oliveira Martins é um dos arautos da
transmissão desse estado de espírito, acusando os políticos, o parlamentarismo
e os partidos, de serem a causa de todos os males. A política, afirmava-se,
quando reduzida a uma mera competição partidária e parlamentar, era um estorvo,
sendo por isso preciso, inadiável – apregoava-se nos últimos anos do século –
engrandecer a realeza para a transformar no poderoso agente da civilização,
necessário para defrontar os novos desafios. Era assim justificada a
necessidade de um novo governo que, apoiado na autoridade real e sustentado
pela apoio e pela adesão das camadas populares, fosse capaz de pôr de lado as
práticas conciliatórias, empreendendo reformas vigorosas, musculadas, que
permitissem ir de encontro aos interesses instalados.
Desta situação irá surgir, de novo
integrado num governo regenerador, João Franco, que, assumirá papel
determinante na função legislativa. Ainda que, levada a cabo com o parlamento
encerrado, o que pré-configurou a prática de uma ditadura, desculpabilizada com
o facto de ser provisória e condicional. João Franco vai assim proceder a uma
profunda reforma administrativa com que pretendeu acabar com os
influentes e com o interesse dos campanários.Para lá das mudanças no ensino,
reformulou o exército, estabeleceu quotas de representação no parlamento e
introduziu profundas mudanças constitucionais. Assim classificou os concelhos
por ordem (primeira, segunda e de terceira categoria), fixando que, os pequenos
concelhos sem capacidade para satisfazer as necessidades básicas deverão ser
agregados aos maiores. É nesta mudança, neste novo panorama administrativo, que
se irá decretar a inclusão do Concelho de Ílhavo no de Aveiro.
Para a esquerda progressista, os
concelhos deviam ser comunidades independentes. Para Franco, positivista, o que contava eram os factos históricos: os municípios e
paróquias só faziam sentido conforme tivessem, ou não, recursos
para prestar serviços de modo a poderem cumprir uma função social. Por isso, na sua ideia, haveria que acabar com os municípios inviáveis,
integrando-os nos grandes municípios.
Mas o que a reforma administrativa –
que centralizou o país em trinta e três círculos eleitorais – visaria seria,
acima de tudo e fundamentalmente, controlar o voto, no sentido de que a
votação dos grandes centros urbanos não fosse pulverizada pelos voto rural (normalmente
reaccionário, clerical).
O Decreto de 28 de Março, revogando a
Lei Eleitoral, vai permitir que a área dos círculos eleitorais coincida com os
distritos administrativos, com o que se pretendeu conceder representatividade
às forças minoritárias. Para conseguir esse desiderato, alguns pequenos
concelhos são anexados aos concelhos mais representativos da área.
O Decreto de 21 de Novembro de 1895
vai nesse sentido fixando a anexação do Concelho de Ílhavo por Aveiro. Em acta
da Câmara Municipal de Ílhavo dessa data[1] dá-se
por extinto o concelho, de que era na altura presidente Augusto Oliveira Pinto
e vereadores João César Ferreira, Henrique Cardoso Figueira e José Maria da
Silva Valente, nomeando-se para administrador na nova orgânica, o Dr. Mário
Duarte (conhecida figura do desporto aveirense, que contava em Ílhavo com
grandes amizades).
Naturalmente, e apesar disso, o facto
não foi bem aceite na terra, tendo-se formado uma Comissão para a Restauração
do Concelho, cujos ecos se fizeram ouvir em toda a imprensa da região e
chegaram ao parlamento.
A integração iria durar pouco
tempo e não teria nenhuns efeitos perduráveis. A situação económica e
financeira do país piorava e era já previsível a queda do governo de Hintze
Ribeiro e João Franco. A Lei Eleitoral já em 1896 fora corrigida; Franco
reconheceria que a sorte dos Governos dependia da prosperidade do País. O próprio Luís de Magalhães, ilustre aveirense, seu amigo, ter-lhe-ia
afirmado: tenho graves dúvidas sobre o êxito da sua politica.[2]
Portugal definhava e o rei D. Carlos
concluiu que aquele governo já não tinha qualquer préstimo, nem para o rei, nem
para o país.
O governo cairá a 6 de Fevereiro de
1897. Era o fim de quatro anos de governo regenerador e o regresso do Partido
Progressista com José Luciano de Castro.
Por Decreto de 15 de Janeiro de 1898, o concelho de Ílhavo será novamente reformulado e recupera a sua
autonomia administrativa. Forma-se nova câmara; a primeira acta pós este
período de anexação data de 28 de Janeiro de 1898, sendo o cargo de presidente
ocupado por Ferreira Pinto Basto (documento 61).
Nessa data, o ilhavense José Barreto[3] dedicou
ao acontecimento um soneto que, por curiosidade, aqui se reproduz:
“Assente sobre um vasto e fértil plano, Em
ruas amorosamente repartida,
De estradas, largos, praças,
guarnecida, Com mui saudável clima em todo o ano
Perfumada pela brisa do Oceano Por
aldeias Formosas envolvida Mãe de nautas valentes, cuja vida
É um poema d’ingente esforço humano
Marítima, piscosa, industrial,
Formosa, alegre, activa e ilustrada De importante labor comercial,
Este é d’Ílhavo a terra abençoada
Hoje enfim, do concelho a capital Esta é a ditosa pátria minha amada”
Não houve, pois guerra nenhuma entre “lampadários” e “cagaréus”.
Mário Duarte até foi um simpático e activo colaboracionista, ao incitar e
apoiar ,em Ílhavo ,o aparecimento do futebol.
E foi daí que nasceu a simpatia dos “ílhavos” pelo
Belenenses,de Mário Duarte.
Mas à falta de melhor-porque não a integração das Galefenhas
no Concelho?- atirem-se os foguetes... e colham-se as canas.
Senos da Fonseca
[3] José Barreto foi um ilustre ilhavense,
indivíduo muito talentoso, actor nas peças O Camões do Rocio,
Côroa da Loira, Opressão e
Liberdade. Ironista admirável, poeta satírico de merecimento, foi um
homem sempre interessado em iniciativas em prol da nossa terra. (In O Brado, de 19/12/1914).
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