terça-feira, agosto 30, 2011

Este mundo está,deveras, perigoso….



Bem Vos tenho dito e avisado: os deuses devem estar loucos para consentir tais desmandos.

Então agora não se apregoa o fim dos «ricos»?

Ora isto preocupa-me:


1- Porque acabando os «ricos» acaba-se com os «pobres». Evidente. Só há «pobres» porque há «ricos».

Passando os «pobres» a ser considerados – «ricos» - será tempo de os esmifrar  até ao tutano. Os mesmos de sempre, sacarão da cassete e apregoarão : os «novos ricos» que paguem a crise». A bíblia bolchevique di-lo e a luta de classes continuará até ao último dos novos  «pobres ricos».



2- Mas preocupa-me ainda mais que sejam estes novos «pobres ricos» que tenham de sustentar os «velhos ricos» que aceitaram empobrecer.Sorridentes, colaborantes, e sem fazerem um manguito.
Poderemos então de  criar uma nova taxa que vá permitir que os ex-ricalhaços continuem ricos a valer.Por assim o merecerem. E há o perigo de que, como trabalhadores (Amorim dixit) venham pedir indemnizações por despedimento de classe, o que poderá atingir números assinaláveis.É mais fácil um tubarão comer carapau em vez de cherna,que um rico dispensar a sua dose diária de caviar.Desconfiem...   

3- É verdade! Ou pelo menos parece: - os «ricos» anda por aí  a oferecer-se para dar uma corda a quem lhes der um porco (cevado).

Eu ando preocupado porque com este abaixamento de ratting ainda um dia posso aparecer, na Forbes, entre os mil «pobres ricos», e exposta a minha fortuna em dez patacos furados.

Não podem voltar atrás e arranjarem um subsidiozinho para manter os «ricos» ainda mais «ricos»?

Se os «pobres» já se habituaram a pagar as crises (esta e todas)…porra… é só mais uma.

E os rapazes ricalhaços lá continuariam a carregar com o fadário. Porque isto de se ser

«podre de rico» deve cheirar que fede.



Aladino

terça-feira, agosto 16, 2011

E hoje a noite apossa-se de mim.

Desta minha janela, lugar de privilégio que idealizei e fiz para mim (e para mais ninguém) vejo acontecer a tarde estranhamente escura. Plúmbea, tristonha, toldada de uma luz pardacenta que parece – só! – existir superficialmente. Olho e pareço tentar perceber este estranho determinismo que leva a natureza a comportar-se como um ser humano. Tão risonhos éramos ontem, esquecidos da amargura de ser consciente quando não fingimos. Sofre-se sempre mais com a consciência de que os outros sofrem, do que com a ilusão que só nós é que sofremos.

Hoje não encontro nada de belo no que me chega e envolve. Indisposto, vou e fecho a janela. Tento assim ficar só eu ….comigo , com a minha realidade interior. De fora não vem nada que me ajude a acordar. A perceber que uma flor qualquer está neste momento a despontar, não sei em que jardim. De certeza num jardim que não é o meu. Ligo a música: espero algo que me alimente e desperte, e me crie a ilusão de que não vale a pena pensar.

A tarde está tão carregada que as minhas penas com ela comparada parecem (tão) leves. E bondosas. Hoje não virão as estrelas. Das serranias a luz alourada da ria não virá fazer a estrada que vem bater no meu degrau. Será uma noite de luar oculto, noite adormecida cheia de nada.

A ria está um molhado indiferente. Sombras aqui e ali recortadas, sonolentas, carregadas de uma monotonia inquietante. Não há cheiro. Nem sequer há vida. Até os barquitos desapareceram. Ah! se eu me pudesse como eles amoirar, e, indolente, deixar-me rodopiar numa valsa à deux temps» a sonhar com o me substituir a mim próprio?!

Tento ficar desperto, a pensar sem pensar. Pois só pensa quem é iluminado por dentro.

Já nem os poentes fazem vogar em mim as caravelas da descoberta. Parece que já não consigo descobrir nada lá fora, pois já nem em mim descubro coisa que valha.

Estou farto de mentir para o prazer, para a glória, para o poder (tudo a que miseravelmente não consegui escapar apesar de de tudo). Só desejo em cada dia que passa, ganhar a liberdade de ser eu.

Tudo o que faço para fora de mim me parece inútil.



SF Agosto 2011

quinta-feira, agosto 11, 2011

Andorinha do mar




Detenho-me

Neste fim de tarde ensolarada

Sentado no murete que me separa da ria

Encho os olhos com o azul vivo das suas águas.

E trago lá de longe as asas da gaivota que graciosamente

Esvoaça.

Conto uma a uma as conchas sem perceber

Para onde foi o seu morador.

E desperto com o chap- chap da tainha que me faz negaças.



Sentado aqui, solitário, vejo mais céu.

Intriga-me esta enormidade sem fim

onde as estrelas se penduram.

Sinto no confronto com a sua grandeza

Que a vida parece custar menos, a mim.

Ou que é menos fria, e que nela há (ainda) acenos frescos:

Uma andorinha do mar veio pousar a meu lado.

Apetece-me viver apenas com os sentidos.

Sentir sem possuir, guardar cá dentro;

A vida na essência do momento.



SF (Agosto 2011)

sábado, agosto 06, 2011

Nestes acode-me revisitar a dupla,inenarrável

PITATO& BENJAMIM, Ltd


Em final da década de cinquenta era habitual ficarmos por ali, junto ao café TAMAR, (actual Luso) a conversar até altas horas da noite. Saber quem levava a chave, era saber quem eram os últimos a recolher a penates.

Entre os contadores de estórias, no inicio da noite, tinha lugar privilegiado o «Benjamim Pardal», que era a delicia de todos nós, tantas eram as patranhas recriadas, inventadas ou concretizadas, por esta figura que juntamente com «O Pitato», constituíram um dos mais famosos e mais conhecido, duo de manipuladores de simpras, crédulos, que embuchavam qual bacalhau esfomeado por sandilho, toda a trapalhice com que aqueles estimáveis «malandrecos» os engodavam.



Eram duas boas pessoas, apesar do muito que se badalava.

O feitio de brincalhão, impenitente e compulsivo, fez com que Benjamim, oficial náutico, nunca tivesse ido além de Piloto. Porque mesmo no desempenho desta responsável tarefa, e em ambiente tenso da dureza da pesca, não deixava de exercitar os seis dotes de enloilador – mor.

A ponto de numa viagem ao bacalhau ter convencido a tripulação que a má pescaria, feita até ali, advinha do facto do Sr. Capitão estar possuído por alma penada, sendo necessário para virar a sorte, «picá-lo», para assim o libertar do Lúcifer que dele tinha tomado conta. E o certo é que a dada altura a tripulação embuchou o isco e anzol, e fez praça à porta do camarote do capitão, de navalha na mão, dispostos ,caridosamente, a libertá-lo da maleita. Não fora a intervenção de um nosso patrício (Sr. Parada) e o Capitão -feito lobisomem - ver-se-ia em apuros para evitar a picadela – a sangria – mais que certa...



«O Manuel Pitato» – o mais ferrenho belenenses de Ílhavo, depois de mim!!, emblema de ouro e brilhantes do Clube de Belém – era o fiscal do Mercado Municipal. Juntamente com o «Manuel das Senhas» zelava pela recolha das taxas que as, tiGalante, tiPata e a ti Tuna, e outras, tinham de pagar para exercer a venda dos produtos, na praça. O «Manuel Pitato» seria, aliás, a figura central de uma monumental polémica da politica local, ocorrida ao tempo da Câmara de Dinis Gomes, que se dizia ser seu Padrinho. Da auditoria ao modo como vinha desempenhando as suas funções, resultaria ter sido castigado(?!) com a ida para a Costa-Nova, para aí exercer as mesmas funções de zelador, no novo mercado local. Diga-se que foi castigo(?!) que apreciou em particular, pois logo a dupla Pitato&Benjamim trocou a «Gruta» pelo «Coração da Praia», para, no salão deste último, disputar renhidas «suecadas».Houvesse – e até havia! - quem se atrevesse a aceitar o desafio da temível parelha.




     
                                                           O BENJAMIM PARDAL

Os Pitato & Benjamim tinham jogo perfeitamente combinado.

(…)

-Atão compadre, como estavam os tomates do tiPio? …perguntava com naturalidade o

Benjamim.
-A cinco a dúzia -respondia o Pitato, a dar o sinal de que tinha cinco trunfos.
-Mas então ontem não estavam a sete?.. compadre...ia dizendo o Benjamim enquanto encartava o jogo, querendo com o relambório perguntar se o colega tinha o sete (a manilha).
- Pois era …mas era ontem – retorquia o Pitato, querendo dar o sinal que não senhor, não a tinha.
Sempre que a xita (o fazer a totalidade das vasas) era evidente, «Pitato & Benjamim» levantavam-se, cumprimentavam -se reverencialmente, e iam cantando:

-Dictum et factum, depenato est,
-Dominum Vos bispo….
-Domi suae est rex
-Et spiritoò… Oremos…

-Amem!...Amém – e batiam a ultima mão na mesa, perante os adversários que, apalermados e fragilizados com tal retórica, por vezes desistiam, ali, na hora.
Os mapas onde iam apontando – e traçando quatro a quatro (como os almudes) – as mãos, eram de regalar a vista; quando sucedia a xita, e conforme esta se tinha desenrolado, havia direito a pintar o diabito de cavanhaque e, até, de cavanhaque e rabo. Eram verdadeiras pinturas naifs de que alguns guardavam amostra, e outros tentavam, sem êxito, imitar.
(…)
Ora um dia o Cap. Zé Negócio abordou-me para me dizer que o Benjamim tinha convencido um «vagueiro», que andava por aí à solta um lobisome; só que –teria dito o Benjamim – não havia picadores em Ílhavo com «os ditos» suficientes para libertar o desgraçado da alma penada que o mortificava. Logo o rústico, ao ouvir o queixume do Benjamim, que punha, entretanto, uma cara de compaixão pela inditosa desgraça do olarapo, ao tempo que levava o tabaqueiro aos olhos parecendo, assim, limpar uma lágrima vertida, se alteava e alorpado, ia dizendo chançudo:

-O que é lá isso; pois saibam V. senhorias :- se querem um picador ele aqui está à vossa frente. É só dizer o sítio onde se mostra a alma penada.

(….)

E logo se combinou uma tramóia; um pipo velho que enchi de água, um frasco de mercuro-cromo retirado do stock da farmácia, uma corda longa fornecida pelo Capitão Zé, e, à meia-noite, lá fomos para a estrada das Oliveiras. Pusemos o pipo no chão ligado ao carro pela corda, e uma parte do grupo foi esperar o picador. O pobre homem lá apareceu, montado na bicicleta, munido de três grandes varas terminadas por espiche. Mostrado o lobisome – o pipo! - o rústico empunha a vara lançando-se como doido… e zás … espeta o barril. Eu arranco com o carro. O pipo aos baldões, salta, rebola, pincha e escangalha-se no paralelepípedo, desfazendo-se em sangue (água e mercurocromo).



Até ali o espectáculo não poderia ser mais fantástico. Inenarrável.



Só que, de repente, o lôfo vagueiro cai redondo a espumar pela boca, apopléctico, parecendo atacado por alma penada. Um escarcéu dos diabos. Rodeámos o homenzinho, e vá de saber o que se devia fazer. Galheta para aqui, abanões para ali e, valeu-nos, um farsante presente que se lembra, felizmente! – do Sr. Mário Lau – que tinha uma tasca ali ao lado. Lá se bateu à porta do dito, e, com um gole de cachaça enfiado pelos gorgomilos abaixo, o «vagueiro» veio finalmente a si. E de olhos esbugalhados, num esgar patético logo gritou:

-piquei-o…piquei-o …era o bruxo da Pedricosa. Eu sabia!..eu sabia! – gritava com o estupor estampado na cara.



Lá recompusemos o sacripanta, e, enfiada a bicicleta no AL (matricula do Ford) lá o fui levar a casa.

(…)

Claro que depois a história durou até de manhã. A garrafeira de meu pai estava lá para nos preencher as noites. E o canário, que na sala de jantar chilreava assim que se acendia a luz, sossegava -o:

- Dorme Eduarda que eles já estão cá dentro, aquietando, assim, a minha Mãe.

(…)

Mas voltando ao Pitato & Benjamim.


                                                             

                                                                        «O Manuel Pitato»

Um dia de Outubro, no «Coração da Praia», a dupla defrontava uns maçaricos que cedo mostravam não estar à altura de se bater com tão sábios suequeiros.Em volta da mesa iam-se achegando uns matolas que por aquela altura vinham a banhos, aproveitando para apreciar o desenrolar do match (ainda não havia ecrãs panorâmicos ). Um deles, um bisnagau com cara de finório, foi logo notado pelo Benjamim.Que não perdeu a oportunidade:

-Pois atão (?!) que me diz, compadre, daquela baleia que ali deu à costa – atirou em ar natural, para o Pitato.

-Homessa! compadre Benjamim, nunca visto, nunca visto. Coisa de Satanás, compadre (dizia benzendo-se, o Pitato). Quinze metros e mais de dez toneladas. Vem aí a tropa com uma cábrea para levar o monstro.

Isco lançado, logo o «matola» quis saber:
-Eh amigos então contem lá, raios!... Não deixem uma pessoa ficar em pulgas
-Oh camarada, «aquilo» nunca visto …. E logo o Benjamim desatava numa lenga – lenga, uma série de trampolinices que acabaram com o escanifrado a dizer:

-Vou buscar a minha Maria e vou lá ver, raios. Nunca vi uma baleia no raio a vida.
E lá partiu.
Para o fim da tarde alguém veio avisar o Benjamim que vinha lá (!) o matola, parecendo que trazia cara de poucos amigos. O Benjamim que armava as trapalhadas mas logo se escapulia se as coisas dessem para o torto, dá por se pôr ao fresco, saindo pelas traseiras do Salão Arrais Ançã.O «Pitato», esse, coitado, dada a sua deficiência, não podia ser tão lesto. Mas afoito, acariciou a muleta, preparando-se para tudo. Chegado o bizarrão, este diz:
-Olhe lá ó camarada: o seu parceiro? -pergunta de um jacto, ao tiManel.
- Olhe como era tarde, já se foi para a missinha. Ele é sacrista, sabe. Mas bom homem, deixe lá a brincadeira; ele gosta de ser brincalhão.

-Ora.ora…não é nada do que está a julgar. Eu vinha, era, agradecer. Está bem que não vimos nenhuma baleia. Mas eu e a minha Maria aproveitámos a maré, e olhe: - demos nas dunas desertas a melhor «cambalhota» da nossa vida. E eu vinha agradecer ao seu amigo, por mim e por ela, e até queríamos convidá-lo para ele ir lá casa provar da nossa pomada.
Até ao fim desse mês ,fim da época dos matolas ,o Benjamim nunca mais apareceu na Costa-Nova. O «Pitato» até pensava que o raio andava mau da tripa, com a jantarada que os bairradinos teriam oferecido ao Benjamim.
Mas passados uns dias apareceu ao «Pitato» ,o bisnagua, inquirindo:
-Oh camarada : - você sabe onde pára o Sr. Cap. Benjamim? È que ele prometeu levar-nos a voar no avião do «seu amigo» Zé Cadengo, e nunca mais apareceu…
Escusado será dizer que o Benjamim desapareceu da Costa-Nova. Dizia, na «Gruta» a quem o queria ouvir, que os ares do mar, nesse ano, estavam muito fortes, perigosos para a sua frágil saúde.

Era assim a dupla Pitato& Benjamim. Estaria aqui até amanhã a contar estórias, petas e tretas, saídos da imaginação delirante desta parelha de verdugueiros.

SF

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