Em 1865, à profunda crise política viria juntar-se a pior colheita agrícola de sempre. O desemprego e a criminalidade atingem níveis nunca alcançados. O país via nos suicídios individuais que grassavam por todo o lado, a aproximação do suicídio colectivo. Os tumultos surgiam por toda a parte. Em particular pela região de Aveiro, com o povo a indignar-se contra o imposto de consumo, entretanto criado. Tentado um plano de emergência e de estabilidade, não se vislumbraram, contudo, quaisquer consequências positivas. Importadas do exterior vão chegando as críticas demolidoras ao liberalismo. Oliveira Martins é um dos arautos da transmissão desse estado de espírito, acusando os políticos, o parlamentarismo e os partidos, de serem a causa de todos os males. A política, afirmava-se, quando reduzida a uma mera competição partidária e parlamentar, era um estorvo, sendo por isso preciso, inadiável – apregoava-se nos últimos anos do século – engrandecer a realeza para a transformar no poderoso agente da civilização, necessário para defrontar os novos desafios. Era assim justificada a necessidade de um novo governo que, apoiado na autoridade real e sustentado pelo apoio e pela adesão das camadas populares, fosse capaz de pôr de lado as práticas conciliatórias, empreendendo reformas vigorosas, musculadas, que permitissem ir de encontro aos interesses instalados.
Desta situação irá surgir, de novo integrado num governo regenerador, João Franco, que assumirá papel determinante na função legislativa. Ainda que levada a cabo com o parlamento encerrado, o que préconfigurou a prática de uma ditadura, desculpabilizada com o facto de ser “provisória e condicional”. João Franco vai assim proceder a uma profunda reforma administrativa com que pretendeu acabar com os influentes e com o interesse dos campanários. Para lá das mudanças no ensino, reformulou o exército, estabeleceu quotas de representação no parlamento e introduziu profundas mudanças constitucionais. Assim, classificou os concelhos por ordem (primeira, segunda e de terceira categoria), fixando que os pequenos concelhos sem capacidade para satisfazer as necessidades básicas, deveraiam ser agregados aos maiores. É nesta mudança, neste novo panorama administrativo, que se irá decretar a inclusão do Concelho de Ílhavo, no de Aveiro.
Para a esquerda progressista, os concelhos deviam ser comunidades independentes. Para Franco, positivista, o que contava eram os factos históricos: os municípios e paróquias só faziam sentido conforme tivessem, ou não, recursos para prestar serviços de modo a poderem cumprir uma função social. Por isso, na sua ideia, haveria que acabar com os municípios inviáveis, integrando-os nos grandes municípios.
Mas o que a reforma administrativa – que centralizou o país em trinta e três círculos eleitorais – visaria, seria acima de tudo, e fundamentalmente, era controlar o voto, no sentido de que a votação dos grandes centros urbanos não fosse pulverizada pelo voto rural (normalmente reaccionário, clerical).
O Decreto de 28 de Março, revogando a Lei Eleitoral, vai permitir que a área dos círculos eleitorais coincida com os distritos administrativos, com o que se pretendeu conceder representatividade às forças minoritárias. Para conseguir esse desiderato, alguns pequenos concelhos são incluídos nos concelhos mais representativos da área.
O Decreto de 21 de Novembro de 1895 vai nesse sentido, fixando a inclusão do Concelho de Ílhavo no de Aveiro. Em acta da Câmara Municipal de Ílhavo dessa data501 dá-se por extinto o concelho, de que era na altura presidente Augusto Oliveira Pinto, e vereadores João César Ferreira, Henrique Cardoso Figueira e José Maria da Silva Valente, nomeando-se para administrador na nova orgânica, o Dr. Mário Duarte (conhecida figura do desporto aveirense, que contava em Ílhavo com grandes amizades).
Naturalmente, e apesar disso, o facto não foi bem aceite na terra, tendo-se formado uma Comissão para a Restauração do Concelho cujos ecos se fizeram ouvir em toda a imprensa da região, chegando ao parlamento.
A integração iria durar pouco tempo e não teria nenhuns efeitos perduráveis. A situação económica e financeira do país piorava e era já previsi vel a queda do governo de Hintze Ribeiro e João Franco. A Lei Eleitoral já em 1896 fora corrigida; Franco reconheceria que a sorte dos Governos dependia da prosperidade do País. O próprio Luís de Magalhães, ilustre aveirense, seu amigo, ter-lhe-ia afirmado: tenho graves dúvidas sobre o êxito da sua politica.
Portugal definhava. O rei D. Carlos concluiu que aquele governo já não tinha qualquer préstimo, nem para o rei, nem para o país.
O governo cairá a 6 de Fevereiro de 1897. Era o fim de quatro anos de governo regenerador e o regresso do Partido Progressista com José Luciano de Castro.
Por Decreto de 15 de Janeiro de 1898, o concelho de Ílhavo será novamente reformulado e recuperará a sua autonomia administrativa. Forma-se nova Câmara; a primeira acta pós este período de inclusão data de 28 de Janeiro de 1898, sendo o cargo de presidente ocupado por Ferreira Pinto Basto (documento 61).
Nessa data, o ilhavense José Barreto dedicou ao acontecimento um so- neto que, por curiosidade, aqui se reproduz:
“Assente sobre um vasto e fértil plano,
Em ruas amorosamente repartida,
De estradas, largos, praças, guarnecida,
Com mui saudável clima em todo o ano
Em ruas amorosamente repartida,
De estradas, largos, praças, guarnecida,
Com mui saudável clima em todo o ano
Por aldeias Formosas envolvida
Mãe de nautas valentes, cuja vida
É um poema d’ingente esforço humano
Formosa, alegre, activa e ilustrada
De importante labor comercial,
Este é d’Ílhavo a terra abençoada
Hoje enfim, do concelho a capital
Esta é a ditosa pátria minha amada”
Senos da Fonseca
(Di livro «ILHAVO ENSAIO MONOGRÁFICO -Séc.X-Séc.XX»)
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