sábado, janeiro 18, 2014




A «ílhava»   Parte II

As visitas tinham um ponto muito curioso. Quando lá chegávamos, já a Etelvina Almeida, uma interessada e excelente fotógrafa – e mais do que isso (!) uma amante das vivências da Ria – por lá cirandava, alcandorada ao escadote ou metida pelos recantos da embarcação, procurando o melhor ângulo, a «disparar» para  registar todos os pontos da execução do projecto (as suas fotografias, em boa hora expostas no MMI, são preciosas).
Ora uma das fotos despertou-me a curiosidade. Atente-se …
 
 
Esta perspectiva recorda a lenda que já insistentemente referi noutros locais. Numa visita Viking, os temíveis nórdicos, no sentido de libertar uma princesa do clã, cativa lá bem para montante do rio, teriam construído, aqui, embarcações pequenas de fundo chato bicudas nos extremos para poderem navegar nos rios estreitos, nos dois sentidos (etc…etc.)
Esta feliz imagem não pode deixar de nos trazer à memória a tal lenda. Então não está ali criada a ilusão de estarmos perante um pequeno «Knarr» de fundo chato?
Pode dizer-se que a construção decorreu em ritmo acelerado.
 
A feitura da vela, cujo plano era um pouco diferente das velas actuais, levantou ligeira preocupação. Desapareceram, praticamente, todos os mestres veleiros. Foi então lembrado o Marco Silva, arrais da Xávega da Torreira, uma excelente personagem que tem velejado no moliceiro da Junta de Freguesia de S. Salvador. Um campeão nato. Desafiado no seu Armazém à borda do mar pela AML, logo ele, auxiliado pela esposa, se agarraram aos planos fornecidos e, na garagem, iniciaram a feitura. Difícil hoje encontrar pano (10 ou semelhante) para a execução, como nos tempos antigos. Houve, assim, que aproveitar pano de duas outras velas de bateira. E mesmo assim, a vela da «ílhava» ficou sem menos uma teada do que se pretendia.







Tal facto fez-me concordar com a montagem do calcador. Creio (ou estou certo) que a vela de pendão inicial das «ílhavas» não tinha calcador, pois armavam na amura de barlavento. Claro que houve evolução, e as últimas tinham já velas tipo das desenvolvidas nos moliceiros (sei-o bem!)
 
 

 
Outra decisão onde foi necessário encontrar unanimidade, foi na finalização: abandonou-se a aplicação do breu, com excepção da coberta da proa, preferindo uma tinta (subcapa) fosca, sem brilho (como no modelo), o que deu um acabamento talvez demasiadamente perfeito (mas muito bonito). Por dentro, preferiu deixar-se a madeira ao natural, apenas coberta por um protector incolor. O realce (contraste) parece-me (é minha opinião) muito bom.

Dado que nesta embarcação não existia o varão para a escota, porque tal atrapalharia a manobra da rede (e porque a vela era apenas para deslocação aos largos), a mesma manobrava através de dois furos abertos na borda a ré. Admito que a posição desses furos, depois de armada a vela, reflecte que, para boa manobra do leme de xarolo (gualdropes), os mesmos deveriam avançar cerca de 20 cm. Coisa sem grande importância.
Claro que a Sala da Ria é exígua para a quantidade de embarcações que alberga. Mas isso é um outro problema.
E volto à ideia que venho defendendo desde há muito. A criação, num outro local (e nenhum será melhor que a Costa-Nova) para aí implantar, um simples mas folgado Museu da Ria e da Xávega, onde se incluísse a exposição de todas as artes inventadas e usadas na Laguna. Já imaginaram o plano (turístico) de visita museológica aos três Museus: da Ria, MMI, e VA, feito sobre água, com programa de entretenimento (Palácio VA) apelativo?

Ora…ora. Temos os diamantes e não sabemos, é, vendê-los.

Estou a terminar (depois de longo tempo) o II Vol. das Embarcações Lagunares. Agora no capítulo das Bateiras. Trato nesse livro, uma a uma, em 2D. Mandei fazer modelos à escala, de todas. E depois, desenhei-as todas em 3D. Mas não satisfeito, atirei-me a tratar de todas as «artes» de pesca lagunares. UfaA!!!!!. Recuperá-las, desenhá-las, descrevê-las, também elas para memória futura, já que a maior parte desapareceu, e de algumas ter sido  mesmo difícil encontrar referências exactas : nem Vos digo! Consegui a sua reprodução a uma escala dessas artes, para apreciação visual concreta.

Assim, a Laguna é o único meio geográfico, em que todos os tipos de embarcações tradicionais que nela trabalharam, ou navegaram, estão, completa e rigorosamente recuperadas, para memória futura. É minha intenção oferecer todos os modelos e Planos (e seus direitos) ao MMI.

 

(CONT).
 

 

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