Carta Aberta
á Professora de Flauta do meu neto ....
Chegado o neto mais novo, casa, para passar a Páscoa, comigo, inquirido sobre as notas do período, lamentou-se
o rapaz que, sendo boas a notas a todas, teve de novo negativa a Musica.
-Eh! pá não me digas que não sabes ,nem ao menos, tocar ferrinhos?
-Não avô o problema é que não aprendo a tocar flauta....
-Ainda bem rapaz, isso é instrumento de meninas..
E vai daí resolvi escrever esta
carta á Digmª Professora de Flauta:
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Ex. m ª Senhora Professora:
Triste e psicologicamente abatido,
o meu neto(J.B..........) trouxe-me a notícia de, e uma vez mais, ser anotado
com negativa, na importante e fundamental
cadeira lecionada por V Exª, mais concretamente na matéria: FLAUTA.
Ora eu não estou em crer na
dificuldade do instrumento, se bom e convenientemente manejável .Bem soprado,
sempre acabará, mesmo que mal tocado, por corresponder ás pretensões do
proprietário. E às expectatvas da soprano.
Devo dizer a V Exª que ,sem dote
algum que me indiciasse poder,um dia ,ser um «mozart»,fui um esforçado
professor de «flauta». Instrumento proibido antes de Abril de 74,a que era
atribuído um nome fellatiano,
muito poético mas estranho na
compreensão literal portuguesa, muito mais talhada para os enfeites peitorais, foi depois introduzido nas
camadas populares, decididas a aprender novas motivações sensoriais. E ai da novas gerações que não saibam tocar
«flauta». A «sublevação» nunca será consumada.
Preocupei-me sempre em demonstrar
que a «flauta», não é, só em si ,e por si, um instrumento de sopro. Não!.... É
um instrumento onde a movimentação, suave mas certeira do dedo, extrai todas as
virtualidades da «cana»- Digo «cana» porque naqueles primeiros tempos, o popular caniço, era
o instrumento menos espaventoso, mas bem mais redondinho(muito mais popular) ,e
por isso mais alcance das camadas mais desfavorecidas. Não na «cana»-longe
disso!- mas na disponibilidade partouze «pífara».
Com muita paciência -e por boa
causa,registe-se - ensinei que não
era apenas um simples movimento labial que fazia «vir» a musica celestial». Não.
Definitivamente. A corrente tumultuosa vinda das profundezas, perturbadora da razão e
do espirito, e dos sentidos, furacão que eleva o mortal ás alturas dos deuses, só se consegue com um suave -e bem ajustado- manejo dos dedos, nos orifícios instrumentais.
Fico pois perplexo como é que V
Exª, formada numa Universidade moderna, certamente «praxada» e certamente solicitada
-certamente
«et por cause», outras por «cause e Comp.»-para o citado exercício
instrumental, com que a massa estudantil desfilava metaforicamente ilustrando grupos estudantis, não consegue explicar a matéria, na
sua complexa mas saborosa, complexidade. Melhor é voltar á reciclagem....
Tomo a liberdade de informar V Exª de que me predispus
ao seu tutelar Ministro, Crato de nome, cretino
de ideias, a oferecer-me como voluntário para o exame de avaliação nesta
matéria, certo de que não me disponho a julgar, mas a exercer uma avaliação continuada da aprendizagem na matéria
(assim sim,é que se aprende o ofício).
Reconhecendo a importância de que
o propósito luso está no saber «musical» do corridinho flauteado, à portuguesa,
sou,
De V Exª muito penhorado
SF
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