sábado, novembro 04, 2023

 “O ÍLHAVO”

O ílhavo é mais do que um vulgar arquétipo resultante das influências (boas ou más) do meio geográfico: o fruto das suas circunstâncias.

O seu projecto, a sua teimosia, a sua perseverança, a sua resistência à adversidade, a sua ânsia de lonjuras fez dele figura com lugar destacado na história pátria.

Mas quem foi,e o que foi ,esse “ílhavo”?

Ao fim e ao cabo, foi o que sempre me motivou: perceber os meus anteriores...libertá-los do anátema redutor de serem, só e apenas, actores de  um único acontecimento(período histórico). 



Esquecidos que, afinal, somos o produto de um projecto áureo (único)de cinco séculos (?) que se integrou e se relevou, na determinação   lusíada de abandono do projecto mediterrânico. Os ílhavos foram os atlantistas de plena convicção. Foi com gentiaga como esta que demos passos decisivos civilizacionais.

Sim!,creio que era chegada a hora de me concentrar e arrumar de uma vez por todas a questão da singularidade do arquétipo ilhavense: o ílhavo.

Ao contrário do que muitos pensaram e verteram em textos pouco ou nada consistentes, a semelhança das variantes humanas regionais lagunares, foram escassas. As diferenças foram muito maiores e exprimiram-se com muita maior intensidade no aspecto psicológico,cultural e até social. É certo que o homem lagunar ,enraizado e limitado a um espaço geográfico vizinho, teria de absorver e transmitir alguns caracteres onde se catam identidades. Os contactos teriam sido intensos, mas a aculturação esteve sempre presente. A diversidade cultural do homem lagunar não se deixou inquinar pela diversidade da sua proveniência ancestral.

O ílhavo é profundamente diferente do murtoseiro, como o é do ovarino e como o é do cagaréu.

De onde lhe veio essa identidade diferente?


De onde lhe veio predomínio da imaginação para o longínquo do mar, numa identidade sonhadora que durou séculos? De onde lhe veio a conciliação terra /mar? De onde lhe veio a inquietude e a aventura? Que linha divisória–e como se manteve– com diferenciação absoluta, a vizinhança? Uns acreditando e esperando a boa vontade dos deuses para ungir a terra promissora, com os mitos e rituais de fertilidade, vivendo o passar do tempo entre o berço e o túmulo. Outros “os da água”, alimentados pelo sonho que neles  despertou e os impulsionou, à partida, em procura do novo. Pouco lhes importando que o túmulo venha a ser a causa do sonho (da paixão): o mar. Importou-lhes o descobrimento do desconhecido, do distante. De varadouro em varadouro em procura da rampa de lançamento para a partida perseguida.

Mas ao querer avançar- vem de longa data esta pretensão- pergunto para quê? Ílhavo é hoje um fantasmagórico deserto cultural. Destruir foi fácil.E falar diferente,parece hoje inutilidade sem sentido.

A palavra “cultura” deixou de ter qualquer sentido. Vende-se ”disso “ a cada canto,em cada cais,em cada malhada, em cada fundeadouro. Vende-se sem se fazerem contas ao retorno. Vende-se cultura a metro, a milhas, a pés. Bem hajam os promotores de tantos cantautores.

 Deles será o reino da “Nocha”.

Senos da Fonseca

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