Pena que há dez anos não nos tivessem dado o apoio, que agora o Governo promete à Renault – Nissan, para o carro eléctrico
Tenho fortes razões, para me queixar -neste particular – da vida, essa magana ingrata, que me fez passar á distância de um cabelo, aquilo que me poderia – e até certo ponto julgo que merecia – dar : um cantinho,um rodapé, por pequeno que fosse, da história.
Se no tempo em que bati - mendiguei – a todas as portas das esferas governamentais, estas tivessem compreendido que o caminho que propunha, era, o viável e correcto, para resolver (no sector que me dizia respeito) aquilo de que tinha a certeza viria a suceder ,mais tarde : -a crise petrolífera. Que já em fins de 90 se tinha começado a desenhar.
A Electron
Voltemos um pouco atrás.
Tive então no final da década de 90 a clara percepção que os veículos de duas rodas eram aqueles por onde a experiência da motorização eléctrica poderia ser a solução ideal, para a movimentação de largos estratos da população urbana. O Projecto que então coordenei, conseguiu, conjuntamente com as empresas a que nos ligámos exteriormente, resolver os pontos mais difíceis do complexo –e totalmente inovador - exercício tecnológico. Quando o veículo foi mostrado em Colmar (França) tudo ficou de boca aberta. A própria BMW logo se mostrou interessada em analisar a novidade. O êxito parecia estar ali a dois dedos de distância. A ELECTRON era de facto - quase! - perfeitíssima. A motorização invulgar (que levaria a Honda a tentar adquirir os direitos do seu Know-How) permitia perfomances iguais ou superiores às dos
melhores veículos térmicos, e em muito maior segurança.
Havia apenas uma questão.
Por outro lado – ao contrário do agora se vem equacionando – o veiculo eléctrico não pode ser carregado instantaneamente, mas, no melhor dos casos, numa demora de 1 a 2 horas. E ainda assim, só parcialmente (30%).
A conclusão a que chegámos foi a de que:
1) As baterias teriam de se reduzir em volume, transformando-se em packs, que seriam integralmente substituídos nos locais de abastecimento (pack montado num tipo de gavetão, de pôr e tirar).
Isso exigiria um novo conceito de baterias, de menor volume e com níveis de descarga mais lentos. As baterias de litium, eram, a nosso ver, as que poderiam vir resolver o problema, se se avançasse para a sua produção, em aumento da relação de capacidade /peso.
Assim fomos aos E.U.A. para tentar convencer os fabricantes americanos (BELL, LOCKEED, e o próprio centro de investigação da Universidade de S. Francisco) a se integrarem no projecto, desenvolvendo os ditos acumuladores energéticos. Sem êxito. O lobby do petróleo não estava interessado no projecto. E fechou-nos as portas.
Do lado do Governo português não se conseguiram apoios para colocar a «Tudor» (fabrica de baterias) a trabalhar com o centro de pesquisa da EDF (a EDP de França), no sentido de se estudar nova bateria.
O projecto Electron, fabricadas que foram as primeiras centenas de veículos, apesar de ter sido recebido com os maiores encómios e esperanças, teve pois, de abortar. Só e apenas, por …ter nascido cedo demais.
Hoje tenho a certeza, tudo seria bem diferente. As baterias de litium, desenvolvidas em packs resolverão satisfatoriamente o problema. Creio que hoje ,de novo,se deveria voltar aos ensaios com os veículos de duas rodas, dada a sua mobilidade e simplicidade, que poderiam resolver os grandes problemas do trânsito urbano, com graus de emissão (poluentes) zero. E zero também na questão do ruído.
Tenha-se em atenção que nas primeiras séries da scooter eléctrica, o preço era apenas 30% mais elevado que o veiculo térmico, normal. Nada que a produção de grande série, de imediato, não resolveria. Tínhamos a certeza que a produção em série traria esse preços bem para baixo. O apuro do sistema de controlo electrónico garantia uma fiabilidade e duração, muito superiores às do vulgar veiculo, movido a motor de combustão.
Há dias um ex-aluno meu da F.E.U.C, que encontrei por acaso, atirou-me:
-Olhe Eng F.você nasceu dez anos mais cedo; se hoje fosse apresentada a scooter eléctrica, você teria os governantes a seus pés. Foi pena…
Pois foi.
Teria sido a cereja em cima do bolo de quem teve uma vida profissional que nunca se contentou com a vulgaridade, e fez do impossível, apenas algo um pouco mais demorado a fazer.
Mas já me sinto satisfeito (?!) de ter sido o responsável pelo projecto do primeiro veículo eléctrico de duas rodas, não apenas sonhado – o que já não era pouco – mas totalmente concretizado.De que há farta literatura, aqui e por essa Europa fora, nos jornais da época. Tive muito orgulho na belíssima equipa que me acompanhou em todos os níveis, e na empresa –Famel- que se propôs ao impossível. Foi pena…para todos nós...
Isto do golpe de asa não ser para todos, é por vezes amargo. Fico a pensar no que poderia sido. Mesmo assim orgulho-me do que fizemos, e que a história não poderá escamotear.
Faço votos para que o Governo avance na sua intenção de apoiar o projecto Renault – Nissan. Este tipo de projectos tem que ter apoios governamentais que lhe dêem à partida condições para a sua sustentabilidade. E até benefícios, fiscais e materiais, para que a revolução energética que permitirá uma independência do petróleo, se concretize,acarretando benefícios para a qualidade de vida, de toda a ordem, tipo e dimensão..
Senos da Fonseca
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