sexta-feira, novembro 28, 2008


Os painéis do Moliceiro, em tese académica


Clara Sarmento publicou a sua tese de doutoramento nas Edições Afrontamento, livro que foi apresentado durante o Colóquio sobre Lixas Filgueira, acontecido no MMI,nos assados dias 17/18.
O livro que vinha «ensolarado» pelo prémio CES para jovens Cientista Sociais da Língua Portuguesa, privilegiava – dizia - temas marginais polémicos e tendencialmente ignorados pelos meios académicos. Prometia, de facto.
Li-o, com algum esforço, diga-se. Não porque a matéria não me interessasse.Mas é extraordinariamente redundante, gongórico, quase circular, muito circular, para explicar uma coisa há muito intuída, que não oferece qualquer tipo de polémica, na verdade.
O esforço da autora levou-a a escrever meio milhar de páginas no fim último de tratar a icnografia e a mensagem escrita, dos painéis dos Moliceiros.
Ora que os painéis são uma expressão de arte popular, isso já o sabíamos há muito. É bem certo que nunca, antes, fora feito um estudo profundo aos actos discursivos e à sua moldura cultural tão intensa e redundantemente. Neste trabalho de tese (e por isso compreende-se a textura) a autora, servindo-se de uma enxurrada de citações (nacionais e estrangeiras) procura explicar os rituais e os juízos do quotidiano, fruto dos valores e condicionantes sociais que tenta identificar nas gentes lagunares. A autora vai incessantemente -e quase diríamos teimosamente - á procura das diversas ideologias (?!) que confluem no espaço da acção dos moliceiros e se reflectem nas pinturas e legendas dos seus painéis.
E aqui não foge ao deixar-se cair em alguns chavões habituais: influências do regime corporativo, bacalhau, etc.
Claro que centrada apenas numa questão particular – embora muito singular - se comparada com a arte popular que enforma o Moliceiro, no seu todo, a autora ao de leve chega a esbarrar com um ponto que urge esclarecer, e que até hoje ninguém o fez: os painéis dos Moliceiros apareceram com o barco ou foram (por costume) inseridos mais tardiamente?
Andamos em volta disso. Neste preciso momento admitimos que os paineis pintados teriam aparecido tardiamente,já no séc. XIX, e só numa parte restrita das embarcações do moliço.O barco esse terá surgido na Laguna por fins séc.XVII e de certeza por todo o séc.XVIII, ao contrário do que a autora pensa e alvitra. Confundir o barco com os painéis é excessivo.
A ser assim há que perceber que os painéis não terão sido uma expressão da cultura lagunar, vista no seu todo – cultura popular marítima -, mas apenas a expressão ritual de, apenas, uma pequena parte das suas gentes. E aqui surge a questão: quem eram essas gentes diferentes, que mandavam pintar os painéis dos seus barcos, que usavam nos costados dos seus bois, bonitas e cromáticas cangas? E que até brochavam os arcos triunfais das suas festas religiosas com as mais garridas cores.Daí o nos parecer excessivo falar de uma entidade regional, a expressar os valores e condicionantes socioculturais. Apenas um nicho, tal nos parece, a nós.
Escrito numa linguagem rebarbativa, académica, hoje muito pouco interessante e pedagogicamente errada se inserta em livro de divulgação, porque impossível de fazer passar para o público, o livro tem, contudo, as virtudes de uma tese para apreciação restrita, sendo muito útil para estudiosos futuros encetarem variadas aproximações, citando-o.
Resumindo : como tese aplaude-se. Como veículo de informação /formação duvida-se que atinja os seus fins, porque pouco acrescenta ao que já tinha sido feito.
Aladino

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