sexta-feira, setembro 11, 2009

D. Maria II em terras lagunares de Aveiro

Tendo visitado primeiro a cidade do Porto e depois o norte do País (Braga, Barcelos e Viana) a Rainha D Maria II decidiu visitar Aveiro, para o efeito tomando a barca em OVAR.
Esta visita e o hábito de suas altezas reais gozarem de uma passeata na ria, antecedeu as visitas do Príncipe D. Luís, que na ria foi conduzido pelo arrais Ançã, celebridade heróica que o Príncipe quis conhecer pessoalmente. E ainda, na ria, se passeou em mercantel transformado em bergantim real, D Manuel que de Aveiro foi, em cortejo náutico, apreciar o Farol da Barra.



Teria sido assim o bergatim real (?).(visita D Manuel.


Voltemos a D. Maria II.

Em 1852,mais propriamente a 22 de Maio, chegava D Maria e o seu séquito a Ovar. Há muito que a Câmara desta Vila, tendo notícia do facto, preparara, apesar de ter os cofres depenados, recepção estrondosa para receber a Rainha. E para o efeito não hesitou em pedir emprestados 2.375$498 reis a um tal «Cavilha», rico proprietário que logo abriu os cordões á bolsa para proceder ao empréstimo, concedido a um juro de cerca de 4%. Rainha à parte, negócios são negócios. Ou como o meu avô João, emigrante na América, dizia no seu inglês macarrónico: «bizinisses is biziness»
Para albergar a Comitiva mobilou-se um quarto com duas camas para o casal real, e outros dois,um para o Príncipe D. Pedro (futuro D. Pedro V) e outro para Infante D. Luís. E outro ainda, para o aio Visconde de Carreira. Pelas casas dos maiores da Vila (Médico, Administrador Concelhio, Vereadores, Clérigo etc.) foram distribuídos os restantes importantes da Comitiva.

Nas escadarias da Igreja, o Presidente da Câmara, M. Bernardino de Carvalho, recebeu a Rainha. Introduzida no templo foi celebrado um Te-Deum com real solenidade a que não faltou a distribuição de esmola aos pobres da terra. O príncipe consorte D Fernando II e o Infante D. Luís, esses, tinham ficado para trás desejosos de apreciar o Castelo da Feira.
À noite foi servido lauto jantar a quantos couberam no acanhado Salão dos Paços do Concelho. Findo repasto houve beija-mão real. O jantar deveria ter sido rico em saborosas vitualhas (certamente peixe) pois que mereceu farto elogio da Comitiva, e em particular, do Duque de Saldanha
[1].
A vinda de suas altezas às janelas dos Paços do Concelho para admirar as iluminações feéricas
[2](?) e ouvir os acordes de música prodigalizados pela Banda de Caçadores 6, foi um momento entusiasticamente saudado (e vivido) por uma multidão interessada em ver uma figura da realeza de que apenas teriam uma ou outra vez ouvido falar. Nos seus trajos tão característicos, onde avultavam e sobressaiam os espantosos chapéus de presilhas com as suas abas largueironas (cerca de meio metro), sustentadas à copa por presilhas de seda [3](cordões, travancas) e borlas no corrupito, as gentes locais chamavam particular atenção dos gentios da comitiva.




Ovarina com chapéu de Presilhas(grav.Portier)

Os homens da beira-ria apresentavam-se de tamancos, envergando as suas características manaias e camisas de abotoadura, colete encarnado e gabão de varino, cingido á cintura. Barrete vermelho debruado a cetim.
Homem e Mulher de Ovar(Grav.Palhares)

O quadro não deixava de ser vistoso e singular, especialmente rico em exotismo, cor, espectacularidade e originalidade do vestuário das gentes varinas, já afamados e conhecidos pela beira do Tejo, por onde pululavam muitos naturais idos destas bandas, os quais mesmo na capital, mantinham os traços diferenciadores da sua cultura lagunar.
Começaria cedo o dia seguinte.
Logo pela manhã a Rainha acompanhada pelo seu marido, o Príncipe alemão, Fernando de Saxe-Coburgo-Gotha, assistiram á missa na Capela de Stº António, onde nas mãos do Frei Zagalo, reverendo abade da mesma, depositaram choruda espórtula.
E foi quando suas altezas por volta das nove e meia da manhã se dirigiram para o cais de embarque, que se relata, terem sido mais de 12.000 ovarinos (já naquele tempo se exagerava a dimensão das manif!) a ocupar praça e as avenidas que iam na direcção do cais da Ribeira, para assistirem ao cortejo real.



Desfile da Comitiva (D.Manuel)

Notícias da altura referem que as embarcações reais e da comitiva teriam sido acompanhadas por mais de 6.000 entusiasmados(e animados) habitantes da Vila até ao cais, para aí se despedirem da sua Rainha. E muitos outros nos seus mercantéis, e ou de moliceiro, fizeram questão de comboiar o cortejo lagunar, levando D. Maria a Aveiro.
A Rainha e marido seguiram num mercantel coberto por toldo, hasteando o pavilhão real, especialmente enviado pela cidade de Aveiro. Em oito outras embarcações vieram os coches reais. E em muitas outras barcas teriam vindo os príncipes e restante comitiva. O trajecto foi animado pelos acordes das Banda de Caçadores 6 dos amigos de Ovar.
A despesa com esta viagem entre Ovar e Aveiro atingiu o valor de 90$040 réis.
A comitiva chegaria a Aveiro, ao cais na Porta da Ribeira, aonde foram entregues as medalhas da cidade à Rainha.Desde as pirâmides ,de um de outro lado do canal, no Alboi e no Rossio do S.João, se viam embarcações a lançar flores sobre «o mercantel real».Das casas da borda do Canal, caíam colgaduras,panos e bandeiras; havia muito povo a dar vivas à Rainha, erguendo chapéus, tabaqueiros e tudo que servisse para criar agitação entusiástica.
Aladino






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[1] Anais do Município.
[2] A iluminação, feita com lanternas estava pendurada numa torre especialmente erguida para o efeito
[3] Presilhas de seda de cinco mil réis




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