sábado, dezembro 23, 2023


 NATAL




O relógio não pàra

O tempo corre

Neste dia, frio e zangado,

A ria palheteada de prata

Parece cansada

Na sua peregrinação

De tanto correr para o mar.

E eu também cansado

Fico a desouvir  o mundo

Onde reina humana expiação.

 


É frio este entardecer,

Não vale a pena fingir

E rezar por mim.

Não, não o faças.

Cheguei à vida

Porque assim quiseram.

Cheguei a sorrir...

Eu não sei bem se o desejava.

Não sabia que ia cumprir

Um fadário em que me negava

Mais fazer pelos outros

Que por mim não ser.


 

Hoje sonho

Noite de magia

Em que nascesse  de novo;

Não  para ser mais o menino

Mas para ser o “Homem”

Que com a palavra derrubasse o muro

Para que por ele passassem

Aqueles para quem não há presente,

E muito menos futuro.


Quereria ainda, antes de partir

Ter a doce ilusão

Uma ilusão do tamanho

Do  meu eu

Em que a humana pequenez

Do espoliado revoltado,

Ferisse a «fera» do mundo avultado.

Para que  quando a manhã nascesse

Não houvesse ricos nem pobres,

Manhã onde o Homem se afirmasse

Querer ser sem condições

A poder olhar livre, em todas as direcções.


 

E quando hoje deixasse de ser hoje,

Este obscuro poema

Transformado presépio real

Pudesse mostrar  ao mundo:


Afinal sempre há  Natal!


Senos da Fonseca


2 comentários:

oicaca disse...

Um poema natalício de rara beleza e sensibilidade, tão vivido, tão experimentado, por quem tem vivido com plenitude a magia da Ria seu berço e sua barca! Obrigado Engenheiro Senos da Fonseca pela sua partilha e tenha sim umas Festas Felizes sonhando que ainda será possível arrepiar caminho e o Homem poder viver em Paz e Concórdia! Um abraço

Joao.roque@egn.pt disse...

Mais um poema com a qualidade a que nos habituou, num misto de crueza e de sensibilidade.
Que esta quadra natalícia ainda lhe traga novos encantos, pois "Afinal sempre há Natal" e que 2024 traga um pouco mais do mundo que sonha.
Um abraço.
João Alberto Roque

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