segunda-feira, outubro 19, 2009

Este gosto de ir ALEM- TEJO

Não sei porquê, de vez em quando cresce em mim uma certa nostalgia que me leva a uma nova e repetida fugição ao Alentejo. É certo que aguento lá pouco tempo. Vou lá embeber-me naquela terra de horizonte a horizonte, antevista, onde brotaram esperanças adiadas de uma mudança que nunca existiu - talvez porque a ninguém conviria-,e isolar-me no seu mar de silêncio à espera de, numa visita qualquer, perceber como pode o homem ser, apenas e só, um escravo do chamamento telúrico da terra, sem intervir sobre a natureza geográfica, desmoralizado pela agrestia que o cerca. Ali mais parece que o homem não fez, antes se deixou fazer.
A volta é mais para encher o olho no bucolismo de um qualquer povoado perdido na imensidão da planície, alcandorado nas faldas de uma ou outra mamoa onde parecem repousar uns perdidos chaparros frondosos a tonificar o ambiente, do que para ancorar em qualquer lado predestinado. Nunca parto para ir a…mas sim para deambular por… Deixo-me ir, perdido em emposta, por aí abaixo, até que o diafragma da retina dispara para captar umas esganadas ruelas com o casario tão sobrante de branco, tão alvo, que parece ter sido brochado na véspera para «me receber». Aí fundeio. Para admirar o encaixilhado das suas portas e janelas debruadas a azulão impante, a chocar com o diluído pachorrento, monótono, da paisagem.



Foto: Lénia Santos

Ou de um amarelo torrado, mais a condizer com a acalmia daquela.

Foto Lénia Santos

Gosto de ver aquele casario debruçado sobre ruela tão estreita que mais parece assim desenhada para que se sombreassem uns aos outros. Porque havendo tanto espaço para que raio haviam aqueles pardieiros de se encostar uns aos outros ao longo de uma linha que a réstia do sol alinhou?!
Gosto, assim, de encher a vista naqueles lugarejos perdidos na planície. Estimula-me ver aquelas gentes remansosas, no fim de tarde escaldante, acocoradas num banquito de pau de sobro, reunidas à porta no vagar da sombra, quase não dando pelo passar do intruso, como que abstraídas dele, e também ,do correr do tempo. O tempo no Alentejo parece correr mais devagar, e por isso, nesse sentido invejo-os.
Deixando estes povoados, só a atitude pachorrenta de uns refocilantes recolhidos na sombra de um qualquer chaparro me estimula.E um ou outro casario isolado de paredes de feitura tosca, virginais no seu branco de cal encimadas pelo telhado



ôcre desmaiado pela continuada cozedura, alapado no cocuruto do monte a interromper a extensão da terra pardacenta.Imensidão de planície a servir de rodapé a um céu de azul esmaltado, tão sereno e limpo, que parece aquietado com a braseira de um sol portentoso.
Sempre tive a noção de o Alentejo ser um motivo excepcional para um fotografo amante da imagem desnudada de subtileza, mas forte no contraste do preto e branco. Imagem que pode nesta paisagem um pouco entristecida, adquirir uma força estética soberba. Poderosa nos contrastes focados de um sobro frondoso a emergir de



um deserto onde parece não existir vida; ou de uma silhueta humana, estática, sobraçando uma vara que lhe serve de amparo, olhar perdido nas lonjuras de uma superfície enrugada pelos sulcos tatuados na superfície da terra seca.



Mas desta vez encontrei belíssimos exemplares de imagens coloridas.,não menos fortes, de uma beleza que enchem o olho.
A mistura cromática (trabalhada ou não?) destes momentos proporciona cambiantes que nos estimulam os sentidos, reclamando a sua apreciação.
Reproduzo aqui algumas que mais me impressionaram.



(Fotos de Nuno Veiga)



Seja contudo qual for a côr com que pintemos o lenço, ele é sempre fabuloso na harmonia que ressalta do fluir do tempo, da constância das formas, da luminosidade, ora estonteante do meio dia, ora repousante no desvanecer da tarde, quase a lutar para se deixar ficar e sobreviver.
Sinto que nos momentos que lá passo fujo de mim e das minhas angustias. E também me invade o devaneio de querer voltar a sentir.A ser eu de novo.

Começo a parecer um estranho. Não sou feito para os céus .Sei apenas o que havia que fazer. E fi-lo. Os que estiveram atrás de mim empurraram-me. O que é que eu poderia fazer? Negar-me?!

É chegada a hora de voltar.Fugir da paz; virar as costas ao silêncio.

E volto então para me defrontar, de novo, com o vozear do mar a desafiar-me .De novo! Sempre ele(!) a lembrar-me que há que cumprir o destino. Ah! cão!,porque te me lembras que um homem não pode ser homem sem provar do teu salgado gosto?Porque «a» deténs enlaçada nos teus braços e m'a não deixas levar, comigo,para onde eu fôr? Porque me prendes, orfão de espanto, a ouvir o teu vozear quando bates,inclemente,com a onda no areal?

Se apartado de ti eu findasse com as minhas angústias a viver ao desbarato as minhas ilusões,ia para longe afogar a sede de te amar,oh!... mar.

Aladino

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