Na apresentação da reedição do livro O MOLICEIRO – Memória da Ria – de Ana Maria Lopes (concepção ,organização, recolha e texto) e Paulo Godinho(fotografia),quase tudo terá sido dito(e bem ).
Sobre o livro que elogiei largamente aquando da sua primeira apresentação ,por motivos que incluo ,agora, no Prefácio da actual edição ,para que fui convidado pela autora, julgo ter dito o bastante, e talvez, o adequado. .E o que pudesse dizer,agora, não traria mais achega que constitua novidade.
Mas foi para mim muito interessante que o Arq.Paradela tenha sublinhado na sua (excelente) apresentação do livro, o seguinte:
Belíssimo não só pela qualidade gráfica e da documentação fotográfica executada naquela época pelo seu filho, Paulo Godinho, a qual não se limitou a ser apenas um registo analítico da investigação, mas que aborda a fotografia no seu campo estético, enquadrando o objecto de estudo, o moliceiro, na paisagem das suas evoluções, explorando a luz diáfana da laguna quando o tema é mais livre, com a sensibilidade e o olhar de um artista.
Ora isto é um facto que importa sublinhar. Porque por vezes o facto da autora ser a Mãe do excelente fotógrafo, Paulo Godinho, ofusca a justeza do elogio. O conjunto de trabalhos de Paulo Godinho, na Ria, seja na faina do Moliceiro, seja na do sal,é verdadeiramente notável. E se é certo que Ana Maria Lopes fugiu a fazer um corriqueiro livro sobre o Moliceiro como bem fez notar o Arq.Paradela ao afirmar :
“
Nesse âmbito, o livro dedica especial atenção aos elementos simbólicos e decorativos, tipificando-os, criando, talvez pela primeira vez, uma espécie de taxinomia dessas obras de arte popular.
Os painéis, bem como as bandas pintadas e as siglas com motivos geométricos, são uma ocorrência intermitente nas artes de pendor decorativo, pelo menos desde os frisos dos antigos gregos, até aos desenhos celtas e aos intricados geometrismos da civilização árabe, que por cá se detiveram durante vários séculos.
Mas esses elementos não são abordados no livro nos seus aspectos estéticos matriciais ou nas suas evoluções formais. Na verdade eles não correspondem a um substrato cultural erudito, mas a uma moda decorativista popular, que se terá instalado em altura incerta, no norte da laguna.
Em vez disso, esses elementos foram objecto de uma organização sistematizada dos temas pictóricos e da sua interligação com os textos que os acompanham, que são também analisados e interpretados pela autora, recorrendo à sua formação linguística, para igualmente os agrupar e classificar tematicamente.
Os textos e os painéis correspondentes que no livro se contam por muitas centenas, constituem só por si um manancial enorme de património artístico de expressão popular que a autora nos oferece num deleitamento total, sem se alongar, como disse, sobre a génese de tais elementos evitando assim cair em especulações do tipo do ovo e da galinha”.
Certo é, porém, que também Paulo Godinho –então com apenas 14 anos – foge ao trivial e já algo «estafado» cliché do Moliceiro, de frente, de lado …e até de «cócaras». PG procura mostrá-lo como instrumento de trabalho(e por isso focaliza pormenores acessórios, caso do vertedouro ,uma imagem notável) e por isso cata-lhe as entranhas. Utilizando com maestria invulgar a luz da Laguna, ora exuberante, ora macia e doce, obtém imagens de extraordinária beleza. No seu conjunto, do melhor que conheço.
Por tudo –do excelente traçado da apresentação do livro feita pelo Arq.Paradela, à escorreita, sóbria, mas clarificadora explicação do que a autora pretendeu (e hoje de novo pretende) com o seu trabalho ,e à justa chamada «à boca de cena» do autor das imagens –tudo esteve bem.
E era precisamente ali que a sessão deveria ter acabado.
SF
1 comentário:
Sinto-me lisonjeado e sem palavras. Nunca tinha sido alvo de elogios tão eloquentes.
Obrigado,
Paulo Miguel Godinho Marques
Enviar um comentário