domingo, janeiro 31, 2010

Evocando o 31 de Janeiro de 1891

Criado num ambiente de republicanismo assumido, orientado para o reconhecimento das virtualidades exaltadas e gloriosas deste sistema que prometia trazer com ele, se revivificada a sua pureza, a possibilidade de ser a fonte de onde brotaria a força capaz de derrubar o abastardamento que dele fez o regime corporativo,ditatorial, de Salazar.Cedo me vi protagonista de intervenções públicas em vários 31 de Janeiro (e 5 de Outubro). Eram apenas e só estas ,as comemorações mais ou menos consentidas (e toleradas) por Salazar. Serviam para dum modo (também ele) mais ou menos público (?), à sombra de se falar um pouco dos ideais republicanos -que começaram na revolta do Porto de 31 de Janeiro de 1891 e que depois se concretizariam em 5 de Outubro de 1910 com o definitivo advento da sua definitiva implantação em Portugal - se aproveitar para dizer cobras e lagartos do bafio salazarento .E até ,quando as coisas aqueciam e se gritava: Abaixo Salazar ! Viva a Republica!, Viva Portugal!!!..... e em uníssono se entoava a Portuguesa."heróis do mar, nobre povo"… etc…etc,fazer passar uma onda entusiasmante, prometedora de acção próxima..
Hoje, ao remexer nos papéis, encontrei o manuscrito de uma intervenção, minha, numa dessas comemorações, levada a cabo no Teatro Aveirense, em fins de sessenta..

Manuscrito ( 1ª pag).


Reli-o.Começo exactamente, então, no mesmo, por referir desde logo que o 31 de Janeiro não foi uma revolução triunfante. E não o foi,não porque o sentir indelével de todo um povo o não desejasse,perante uma Pátria hipotecada aos interesses estrangeiros. O 31 de Janeiro falhou - adiantava eu -pela impreparação revolucionário do povo.
Hoje se tivesse de participar uma vez mais em outro qualquer comício das comemorações dessa, tão gloriosa como dolorosa data, diria exactamente o mesmo.

De facto a revolta do Porto teve o seu quê de extemporâneo. Era certo que havia dissidências entre os republicanos do Porto e de Lisboa sobre o modo, de como e quando, fazer eclodir a revolta no sentido de apear a Monarquia de D.Carlos.Que estava podre, caduca e corrupta. À espera de um empurrão para cair.Era contudo preciso dar tempo para «os colocar de acordo», dada o tumulto provocado pela questão do ultimato inglês,ainda não digerido.

Três semanas antes da «revolta», os elementos mais moderados tinham conseguido exactamente chegar a tal situação. Mas um acontecimento fortuito relacionado com a oposição dos sargentos à Lei que impunha que os lugares de Alferes fossem exclusivamente ocupados por alunos da Escola do Exército, fez grassar uma forte indignação nos Sargentos, contra a mesma, levando à organização de um levantamento nos quatéis, decidido à revelia do directório do Partido. Durante a revolta os oficiais das unidades do Porto mantiveram-se alheios ao «golpe».

Mas o Povo, esse, esteve ao lado dos revoltosos, vitoriando-os entusiasticamente, servindo-lhes aguardente e pão quente, depois de uma noite fria e chuvosa, suportada fora dos quartéis.. E das janelas da Câmara do Porto, pôde Alves da Veiga proclamari pela primeira vez em Portugal -ainda que por escassas horas- a Republica.E até anunciar o nome dos elementos que iriam constituir o primeiro Governo Provisório.




A 1ª Proclamação da Republica (Porto)

Revoltosos e o Povo dirigiram-se então para a Praça da Batalha. Das janelas, senhoras de braços pousados nas colgaduras com que repentinamente se apressaram a enfeitar as janelas debruçadas sobre a rua íngreme, gritavam entusiasmadas, acenando freneticamente aos bravos do batalhão. A marcha parecia triunfal. Só que quando subia a rua de Stº.António, postada lá no cimo, a Guarda Municipal -provando que as autoridades civis e militares do Porto estavam perfeitamente ao corrente do plano - equipada com recente armamento de grande eficácia, entrincheirada nas escadas da igreja, fez inesperadamente fogo apontando ao peito dos revoltosos. A rua ficou num ápice, juncada de cadáveres.


A carga da G.M.


A marcha retrocedeu. Povo e soldados, atropelando-se, fugiram espavoridos. Aí o Cap. Leite e o Alferes Malheiro resistiram heroicamente, tentando reagrupar os seus soldados, ao tempo que interpelavam os oficiais da Guarda Municipal de quem não se esperava tamanho, e tão feroz, procedimento. Retrocedendo até ao largo Municipal, apesar dos esforços dos referidos heróis revolucionários, não houve outra atitude senão a rendição.

O Porto «o berço da liberdade», «a cidade Invicta», honraria assim, uma vez mais, o seu historial. Já tinha sido ali, naquela cidade, que eclodira a primeira revolta liberal. Aconteceu em 1820,com a ajuda do batalhão de Aveiro. E nela se gritou,então, «às Cortes».

Também em 31 de Janeiro de 1891 se gritaram vivas à Liberdade, à Revolução e à Republica.



Conselho de guerra a bordo do »Afonso de Albuquerque«

Senos da Fonseca

PS –Não era fácil nesses anos de sessenta, subir ao palco e invectivar o regime. Conduzido pela mão de minha Mãe, desde miúdo que me habituei a essas refregas.

Era um risco;confesso porém que pouco ligava a isso.E até tenho um episódio curioso que não resisto a contar.

Recordo-me de um dia após uma dessas intervenções, trabalhava eu na então Companhia Portuguesa de Celulose, do espanto dos meus colegas mais velhos à minha participação num Comício ,onde atirei forte e feio no regime Salazarista, o que veio noticiado nos jornais da época. Avisaram-me que estava a pôr em causa a estabilidade do meu lugar. Curiosamente, para espanto ,o eng. Quevedo(adm todo poderoso) da CPC, passado pouco tempo promoveu-me com rapidez nunca vista naquela casa.E mais. Louvou-me pelo trabalho desenvolvido.

E pouco tempo depois era eu que me despedia (com amizade de todos) por entender que não tinha feitio para chegar a general só depois de velho.Apesar de… todos os esforços do Quevedo para que eu ficasse.

Mas as coisas nem sempre eram assim...
SF

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