(Parte II)
Eu e a Srª do Pranto
À tarde era a
procissão. As Irmandades, ladeavam os anjinhos de vestimenta a condizer, onde
pontificavam as asas brancas, que era imaginado levá-los a
passear pelo céu. Vinham
os andores, enfeitados, jardins prodigamente floridos, sendo o da Senhora, o último.
Era seguido pelo «pálio» que albergava o Priorado, conduzido por figuras gradas
da comunidade. A banda marcava o compasso, e era seguida por multidão que
engrossava a fileira dos adeptos do Orago.
A propósito do
andor….
tinha acabado o
sétimo ano, e comigo, o Zé Balseiro, o Malaquias e o Álvaro, rapaziada
estudante de Cimo de Vila. Convencidos do bom olhado do Orago, todos prometemos,
se as coisas corressem bem, levar o andor na procissão. Quando fomos buscar (a
miniatura,veja-se bem!!!!) à «Capela do Morgaqdo da Srª da Nazaré, constatámos
que apesar de miniatura,o Orago ( que diziam ser uma réplica pequena) era todo
feito de pedra de granito, tendo um peso de se lhe tirar o chapéu. Vamos
desenrascar isto… se bem o pensámos, logo o fizemos A primeira coisa foi tirar
as costas, ao dito, substituindo-as por palha. Ainda por cima, a procissão, nesse ano, ia dar a volta ao Cruzeiro
(o que nem sempre sucedia). E lá começámos …o nosso calvário. Levar a Senhora a
percorrer as vias sacras do Cruzeiro, vir à Igreja Matriz, e voltar a Cimo de Vila. Foi um caso
sério. Eu e o Malaquias, à frente, mais baixos, apanhávamos com o peso,
acrescido da componente da deslocação,
inclinada. E por vezes andávamos aos baldões. Foi preciso recorrer aos garfeiros (?) (devem ter um nome
próprio, as varas com a muleta para pousio nos momentos de paragem, metidos nos
varais) amiúde para nos acudir.
Lembro-me que
só não chorei por vergonha. Mas raios (!), um «Fonseca» ir-se abaixo das
canetas, era miserável. Depois soube, que, afinal, todos estivemos com vontade
de desistir. Mas pela mesma razão, por respeito aos nossos nomes, cerrámos
dentes, retesámos músculos e levámos a Senhora, sã e salva, a bom porto…(ando a
descontar pecados desde então…).À noite estávamos todos encangados, a
tratamento de pachos quentes, para safar as pisaduras.
O arraial da festa tinha lugar à «sombra» do Arco imponente.
As tendinhas dos
bolos (suspiros – de que eu gostava particularmente –, bolos de gema ,cavacas,
etc), as tasquinhas de «comes e bebes», a mesa da vermelhinha (onde eu perdia
tempo para decifrar o enigma),a quermesse, o balcão do tiro às latas, eram locais por onde o povo ia gastando a noite.
Lá
para as 11 da noite, havia o ponto mais esperado: -o concerto das bandas. Entre
os temas reproduzidos, os assistentes deslocavam-se, de coreto em coreto (lembra-me
de ver a Musica Velha, sob regência do Prof.Guilhermino, e a Musica Nova, sob a
batuta do maestro José Morgado, em franco despique que levava ao rubro a
assistência ,sucedendo, não raro, o desforço físico),para melhor ouvir os
acordes(e as desafinações…).Os maestros –ouvi dizer– tinham estratégias
delineadas, em que uma peça de uma das
bandas, de determinada dificuldade, levava logo o outro contendor, a atacar, com peça, ainda (!), de mais complexa
execução. Durante a exibição de cada peça reinava um silêncio sepulcral; no
final, as palmas . A intensidade e
duração, das mesmas, levaria ao reconhecimento do vencedor do duelo.
----------------------------------------------------------------------------------------
O
dia seguinte era o que mais me atraía ao largo da Capela. Era tempo para
divertimento popular: foguetes, que ao explodirem soltavam bonecos de papel que
voavam; lançamento de cavacas á multidão. Subida ao mastro encerado, para
trazer o bacalhau. O puxar da corda, a corrida de sacos, a disputa do jogo da
malha.Um popular jogo, onde as equipas espalhadas pelo Concelho ou fora dele
(até!),se batiam, exibindo virtualidades de precisão incríveis, e onde o
posicionar do corpo, ligeiramente agachado, pés, um atrás do outro, braço
esquerdo estendido, servindo de equilíbrio ao braço lançador, era um
espectáculo de rara beleza, em que
apenas no golf encontro sincronização tão exigente.
No
jogo da corda a equipa que contasse como Carlos Fonseca era a ganhadora; o
Carlos, meu primo, filho do Manuel ,era um verdadeiro Apollo. Forte como um
touro, de uma força braçal incomensurável, tronco hercúleo num corpo de quase
dois metros,, não me recorda de alguma vez ter visto outra tão colossal figura
E VIVA A PÁTRIA!!!!!! exultava a dançar, a
encolher e esticar o fole da concertina, comandando o trio de exímios Maneis Concertinistas : O Velho Ti Manel (com
os seus 82 anos) ,o seu filho Manuel Fonseca, e o meu pai -sim o meu Pai safava-se bem na sanfona -de seu nome, ele também, Manuel
Fonseca. Lá em casa só eu é que desbotei….
Sem comentários:
Enviar um comentário