Ainda o o ÁBIO (o JA Paradela)
O Ábio tinha, há anos,ilustrado um livro « PREIA MAR »que nunca me atrevi a publicar, há muito pronto.Ainda há pouco tempo ,já doente me escrevia: » Vá (!)publica;é o melhor livro que escreveste ».Eu respondi:só se for por ter ilustrações tuas.
Cato hoje no livro um poema(?) o « Lavrar do Mar ».Incluo a ilustração do àbio,em jeito de homenagem(para já).
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32. LAVRAR O MAR
Olho aqueles corpulentos
Majestosos e hercúleos
Bois da velha companha
Que enlaçados ao calão da rede
A vão alando até deixar ofegante na praia
A parir do ventre estripado
O prateado peixe roubado ao mar.
Animais vindos do lado de lá
Do perfume adocicado da resina
dos pinheirais
Trouxeram-nos à borda a lavrar o mar.
Vão nas manhãs de nevoeiro em parelhas
Cabeça baixa, olhar torvo, parecem, citados pelo mar,
A investir por ele vaga adentro encharcados.
Afagados pela maresia
Nos dias de sol espraiado
Vejo-os resfolgarem, nariz no ar
À procura de uma sombra no areal caiada,
Que aqui não existe. Parecem velhos...
Os bois nasceram já velhos
Na cor pardacenta do seu costado.
Velhos no sossego da sua existência
Vão ruminando no alento da noite, a sua ausência,
Para no amanhã acordado voltarem ao fadário.
Sob sol escaldante , chuva de tarde desmaiada,
Ou fustigados pelo vento gélido da madrugada,
Seguem de olhos turvos, despidos de um qualquer sudário,
Parecem amarrados a uma existência amargurada.
Sigo-os duna abaixo
Ao encontro do mar ousado, quebrado
Mar amargo, mar azul de tão salgado
A açoitar o xávega que, alevantado, teima ir,
Lá longe onde moram as sereias,
Largar a rede para tirar do ventre do mar
A prata que a terra não pode parir.
E lá vão, dobrados, encabrestados
Vão ao tropeço na areia lassa da duna.
Fustigados pelo aguilhão do abegão
Levando à sua frente, aos tropeções, os mirones
Que vindos de madrugada, de chapéu e botifarras,
Calça arregaçada, desertam em louca debandada
Em tropel, fugindo na frente do estoiro da manada.
Na praia já se alinham os xalavares.
Os bois doridos pela jornada
Parecem perdidos no areal
Semeado de escasso espezinhado, esmagado.
Hoje não há mais ir e voltar
Hoje mar... podes ir acolher o sol dourado
E com ele ir, lá longe, nos longes teus, namorar.
SF (Março 2015)
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