LAVRAR O MAR
Olho aqueles corpulentos
Majestosos e hercúleos
Bois da velha companha
Que enlaçados ao calão da
rede
A vão alando até deixar ofegante na praia
A parir do ventre estripado
O prateado peixe roubado ao mar.
Animais vindos do lado de lá
Do perfume adocicado da resina
dos pinheirais
Trouxeram-nos à borda a lavrar
o mar.
Vão nas manhãs de nevoeiro em parelhas
Cabeça baixa, olhar torvo, parecem, citados pelo mar,
A investir por ele vaga adentro
encharcados.
Afagados pela maresia
Nos dias de sol espraiado
Vejo-os resfolgarem, nariz no ar
À procura de uma sombra no areal caiada,
Que aqui não existe. Parecem velhos...
Os
bois nasceram já velhos
Na
cor pardacenta do seu costado.
Velhos
no sossego da sua existência
Vão
ruminando no alento da noite, a sua ausência,
Para
no amanhã prateado voltar ao fadário.
Sob
sol escaldante ou chuva de tarde desmaiada,
Fustigados pelo vento gélido da madrugada
Seguem
de olhos turvos, despidos de um qualquer
sudário,
Parecem
amarrados a uma existência amargurada.
Sigo-os
duna abaixo
Ao
encontro do mar ousado, quebrado
Mar
amargo,mar azul de
tão salgado
A
açoitar o xávega, que alevantado teima
ir,
Lá
longe onde moram as sereias,
Largar
a rede para tirar do ventre
do mar
A prata que a terra não pode parir.
E lá
vão, dobrados, encabrestados
Vão
ao tropeço na areia lassa da duna.
Fustigados
pelo aguilhão do .abegão
Levam
à sua frente, aos tropeções, os mirones
Que
vindos de madrugada, de chapéu e
botifarras,
Calça
arregaçada, desertam em louca debandada
Em tropel, fugindo na frente do estoiro da manada.
Na
praia já se alinham os xalavares.
Os
bois doridos pela jornada
Parecem perdidos no areal
Semeado de escasso espezinhado, prateado.
Hoje
não há mais ir e voltar
Hoje mar... podes ir acolher o sol dourado
E
com ele ir, lá longe, nos longes teus, namorar.
[ para que as gaivotas voando sobre os vossos beijos,
me venham de madrugada contar a estrela do pássaro e
a estrela do grito teu....MAR!
SF (Março 2015)
(
Escreveram - se belas páginas a descrever o tumulto grandioso da arte xávega. Esquecendo
figurantes de primeira que encheram de espanto poetas e simples mirones. Hoje resolvi prestar jus
a quem, ficando na praia, permitiu aos outros ir ver os sóis fugidios).
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